Félix Tshisekedi, tem estado, desde que há cinco meses assumiu o poder, em conversações com os seus homólogos de Angola - a primeira visita de Tshisekedi após assumir o cargo foi a Angola - e do Ruanda, Paul Kagame, com o envolvimento igualmente importante do Presidente do Uganda, Yoweri Museveni, para procurar capacidade em meios e em organização para libertar aquela parte do país do flagelo das guerrilhas com origem nos países vizinhos, mas também as dezenas de milícias e de movimentos guerrilheiros internos, como o M-23.
Esta operação, que deverá contar com a participação da Missão da ONU na RDC, a MONUSCO, a mais abrangente e custosa que as Naçoes Unidas mantêm em todo o mundo, com um contingente armado que apoia as Forças Armadas da RDC (FARDC) em acções de combate contra as guerrilhas, visa, segundo as palavras proferidas no Domingo pelo Presidente congolês, a "irradicação total" das forças desestabilizadoras presentes nesta parte do Congo, das mais ricas em recursos naturais, nomeadamente diamantes e minérios, como o coltão.
Numa mensagem dirigida à nação, Félix Tshisekedi (na foto, ladeado por João Lourenço e Paul Kagame) propõe-se a conseguir aquilo que o seu antecessor, Joseph Kabila, não conseguiu em quase duas décadas de poder na RDC, seja pela via da força, seja através de programas de reinserção dos elementos das guerrilhas e das milícias, a quem lançou um "vibrante apelo" para que deponham as armas e aceitem as condições oferecidas para a sua reinserção social.
A RDC, apesar de ser um dos mais populosos países do continente africano, claramente um dos mais ricos em recursos naturais, vive há décadas uma evidente falta de capacidade de resposta para a pressão exercida por vários movimentos de guerrilhas estrangeiros que desestabilizam o leste.
O destaque nos protagonistas desta intensa e prolongada desestabilização do leste do Congo nas províncias de Ituri, Kivu Norte e Kivu Sul, com fronteiras com o Uganda, Ruanda e Burundi, vai para organizações como a Aliança das Forças Democráticas (ADF), com origem no Uganda, e as Forças Democráticas para a Libertação do Ruanda (FDLR), que ali espalham o terror desde a década de 1990, nascidas no rescaldo do genocídio dos tutsis pelos hútus em 1994, no Ruanda.
Para além de ser uma das regiões mais ricas da RDC, o leste é igualmente dos mais populosos, e é parte do coração da complexa e volátil região dos Grandes Lagos, onde milhões de refugiados de várias guerras se amontoam em campos de acolhimento que de provisórios há muito se transformaram na sua casa, outros dos factores que ajudou a que a epidemia de Ébola que graça na região desde 01 de Agosto de 2018, se esteja a revelar como uma das mais graves de sempre e das que mais difícil se está a revelar no combate, sendo que estes movimentos, guerrilhas e milícias estão por detrás de vários ataques às equipas médicas internacionais que no terreno procuram debelar a doença, a mais letal das febres hemorrágicas, que já vitimou mais de 1.500 pessoas e dá sinais de progressão assustadores para os países vizinhos.
Esta realidade é bem conhecida do Presidente Félix Tshisekedi, mas também do Presidente João Lourenço, e do ruandês Paul Kagame, que estiveram reunidos recentemente em Kinshasa, para discutir assuntos de interesse comum, com esta questão da violência no leste da RDC no topo da agenda.
No comunicado final da reunião, os três Chefes de Estado, sublinhando a importância de envolver outros lideres da sub-região, propõem-se a criar condições adequadas para "acabar de uma vez por todas com o fenómeno da violência de grupos armados" no leste da RDC, sejam eles de origem interna ou estrangeira, coincidindo ainda na redinamização da Conferência Internacional da Região dos Grandes Lagos (CIRGL) como uma das plataformas ideais para conduzir esse esforço.
Um dos nomes que os três Chefes de Estado - Lourenço, Kagame e Tshisekedi - tinham em mente quando em Kinshasa apelaram à participação de outros líderes regionais é o de Musevini, do Uganda, um país incontornável neste programa de irradicação dos grupos armados, porque as ADF são, hoje, um dos movimentos de guerrilha mais activos no leste da RDC e boa parte das suas bases estão naquele país, de onde são originários.
Recorde-se que tanto as ADF como a FDLR ficaram durante décadas na RDC principalmente porque é ali que podem explorar os recursos naturais existentes aproveitando a desorganização estrutural do Estado congolês, impondo a sua lei junto das populações indefesas, que usam para trabalho escravo quase sem oposição.
Apesar de não ter sido divulgado o conteúdo, o ministro das Relações Exteriores, Manuel Augusto, esteve, no espaço de escassas semanas, duas vezes no Uganda, a 25 de Maio e a 17 de Junho, onde entregou cartas do Presidente Lourenço ao seu homólogo Musevini.
Na explicação oficial do MIREX, as missivas de João Lourenço continham a manifestação da vontade do Chefe de Estado angolano em reforçar a cooperação entre os dois países, mas, presumivelmente, a questão da segurança da região dos Grandes Lagos estava contida nas mensagens de João Lourenço.
Isto, porque não é segredo que a estabilidade da RDC, país com quem Angola partilha uma fronteira de mais de 2.000 km"s, é uma das mais proeminentes prioridades da diplomacia e política externa angolana, até porque, como sucedeu em 2017, com as convulsões no Grande Kasai, sul da RDC, que provocou a fuga de milhares de pessoas que procuraram segurança em Angola.
É também relevante o facto de a presença de forças militares angolanas em território congolês já ter sido admitida por chefias militares angolanas, a par das notícias que se repetem ao longo de anos sobre a presença de um forte contingente de militaras da FAA integrantes da guarda presidencial do Presidente da RDC, Joseph Kabila, pelo menos até à sua substituição no início deste ano pelo actual Presidente Tshisekedi.