Segundo Valter Filipe, o então Presidente da República, José Eduardo dos Santos, havia solicitado que ele e o ministro das Finanças, Archer Mangueira, lhe remetessem um parecer conjunto sobre a criação do fundo de investimento de Londres. No entanto, continuou Valter Filipe, "o ex-ministro Archer Mangueira preferiu enviar um parecer unilateral à Presidência da República".

"O Presidente anulou esse parecer por não ser conjunto, como tinha ordenado", acrescentou.

"Do meu ponto de vista, é gravíssimo que um ministro das Finanças entregue à Procuradoria-Geral-da República um memorando que foi anulado pelo então Presidente da República, tendo o mesmo solicitado um outro parecer conjunto", disse, pedindo ao tribunal que, do inquérito que irá ser feito ao Presidente da República lhe seja perguntado se ele anulou ou não o parecer do então ministro das Finanças, Archer Mangueira.

"Parecer que Archer Mangueira fez questão de apresentar à PGR e que foi usado por este órgão como base para este julgamento", declarou, voltando a afirmar que o processo foi mal instruído.

Estas acusações de Valter Filipe surgem depois de na sessão anterior, na quarta-feira, 18, ter também acusado o actual governador do banco central, José de Lima Massano, de prestar falsas declarações à Procuradoria-Geral da República (PGR) na fase de instrução do processo.

"O senhor José de Lima Massano prestou falsas declarações e levou o Ministério Público a instruir mal este processo todo. Não sei por que razão. A transferência foi legal. Eu tinha, sim, competências para transferir até 500 milhões USD", declarou.

Valter Filipe afirmou,também, ter recebido orientações do ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos, para transferir os 500 milhões USD do BNA para o Crédit Suisse de Londres (Reino Unido).

"Antes de sair do BNA informei o actual governador sobre a operação e deixei claro que estava disponível para esclarecer qualquer dúvida sobre o andamento do processo", disse o antigo gestor do banco central.

Valter Filipe disse ainda que todo este processo "foi conduzido" pelo antigo Presidente, que o Banco Nacional apenas coordenou a equipa de negociações e "não camuflou nada sobre a transferência, como diz acusação".

O antigo governador do BNA afirmou, em tribunal, durante o seu interrogatório, que o ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos, lhe ordenou que passasse toda a informação sobre o processo da transferência dos 500 milhões USD e sobre a criação do fundo de investimento em Londres ao seu sucessor, para que João Lourenço e o seu Governo continuassem com a operação.

Valter Filipe disse que participaram no encontro Manuel Nunes Júnior (ministro de Estado para a Coordenação Económica), Pedro Sebastião (ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança), Frederico Silva Cardoso (ministro de Estado e Chefe da Casa Civil) e Archer Mangueira (então ministro das Finanças, actual governador do Namibe).

"Eu informei ao Presidente João Lourenço sobre o processo da captação dos 30 mil milhões durante uma audiência em que estiverem presentes, para além do Presidente, todos os ministros de Estado e os ministros das Finanças e da Economia", salientou o ex-governador.

Valter Filipe disse ainda que o actual Presidente João Lourenço, o orientou a entregar todo o processo ao então ministro das Finanças Archer Mangueira para este levar a cabo a condução do processo.

De acordo com antigo governador do BNA, depois de fazer a entrega ao ministro das Finanças, João Lourenço disse-lhes para irem a Londres (Reino Unido), para que oentão ministro Archer Mangueira fosse informado de todo processo.

Questionado se essa operação cumpriu com todas as normas de orientação do BNA, o réu respondeu que cumpriu e que não violou nenhuma delas.

Valter Filipe disse também que o BNA, no fim da capitalização do investimento dos 30 mil milhões, tinha ainda a pretensão de celebrar um outro contrato com o sindicato bancário de Londres, para a captação de 300 mil milhões USD.

O ex-responsável pelo BNA, que reafirmou que tinha competência para ordenar a transferência dos 500 milhões de dólares e que toda a operação "ultra secreta" foi lícita, falou ainda do "quanto é difícil" esta situação "para uma pessoa que defende a ética e a moral".

Recorde-se que o ex-governador do Banco Nacional de Angola, Valter Filipe, e o antigo presidente do Fundo Soberano, José Filomeno dos Santos, estão acusados de branqueamento de capitais e peculato, no âmbito do conhecido caso dos 500 milhões USD transferidos ilegalmente do BNA para o estrangeiro.

A José Filomeno dos Santos e a Valter Filipe juntam-se ainda, na condição de arguidos, Jorge Gaudens e António Samalia Bule.