"Se não fosse filho do ex-Presidente da República não estaria aqui a ser julgado por vós. Foram os senhores quem me colocaram nessa condição", disse, durante a sua fase interrogatória no julgamento do caso 500 milhões USD.
No princípio do interrogatório, José Filomeno dos Santos mostrava-se muito nervoso, situação que levou o juiz João da Cruz Pitra a interromper a sessão para perguntar ao réu se estava psicologicamente bem para continuar a responder às perguntas do tribunal.
Zenu respondeu que estava tudo bem, e que podia continuar a ser ouvido, apesar do intenso calor que se tem feito sentir em todas as sessões naquela sala de audiência.
José Filomeno dos Santos afirmou ainda perante o colectivo de juízes que a operação (um fundo estratégico de 35 mil milhões USD) só não teve êxito porque "está a ser agora julgada pelo tribunal e não alcançou os objectivos que estavam definidos".
Perguntado pelo juiz principal, João da Cruz Pitra, se a transferência ilegal dos 500 milhões do Banco Nacional de Angola (BNA) para uma conta no Credit Suisse de Londres, Inglaterra, não constituiu o êxito da operação, o ex-gestor do Fundo Soberano de Angola respondeu que "os 500 milhões deveriam ser geridos com base num contrato assinado entre o BNA e um consórcio que não foi executado porque foi anulado pelo novo Executivo".
Questionado porque não foi com o seu amigo Jorge Gaudens Sebastião entregar a carta com a proposta de financiamento para um fundo de garantia ao Estado angolano ao Chefe de Estado, que na altura era José Eduardo dos Santos, " Zenu" respondeu que foi por dois espectos:
"O primeiro é que ele não tinha sido convocado, não tinha audiência marcada para estar presente, e com a função que eu tinha no Fundo Soberano fiz chegar essa correspondência ao Presidente da República", afirmou, acrescentando que "o segundo motivo foi porque a carta não partia da empresa Mais Financial Service, mas sim de um banco estrangeiro onde mencionavam os nomes dos senhores Hugo Onderwater e dele como os potenciais interlocutores desse processo, caso fosse aceite pelo titular do poder Executivo".
Perguntado se é normal uma carta com aquele pendor ser entregue em mão por alguém que não é funcionário daquela instituição, respondeu que "a carta vem sempre da mão de alguém, e o objectivo era chegar ao destinatário, conforme chegou".
Interrogado se da experiência que tem, é normal dar a carta alguém para entregar, respondeu que sim, dada a ligação que o Fundo Soberano tinha com a presidência.
"Não acredito que por a carta ter chegado às minhas mãos se considera que foi entregue a qualquer pessoa. Mas esse é o vosso entendimento e eu respeito", salientou o filho do Ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos.
A sessão de julgamento foi também marcada por discordâncias entre o juiz conselheiro José Martinho Nunes, e o juiz principal, João da Cruz Pitra, depois de "Zenu" ter dito que tinha ouvido falar de um pacote legislativo que antecederia as negociações de forma ser criada uma estrutura que seria absorvedor desse financiamento, mas não sabia detalhes.
O juiz conselheiro José Martinho Nunes insistentemente perguntava a "Zenu" que pacote legislativo era esse, que normas, decretos, projectos e leis continha.
Zenu dos Santos respondeu que não sabia como estava constituído e que apenas tomou conhecimento de que o BNA tinha feito uma proposta ao Executivo para que esse programa de financiamento pudesse ser implementado, ao que o juiz conselheiro José Martinho Nunes insistiu repetidas vezes na mesma pergunta.
A insistência agastou o juiz principal João da Cruz Pitra, que, de seguida, interrompeu o seu conselheiro e disse: "Não esforça o réu a falar aquilo que não sabe ou não quer dizer, se voltar a fazer esse tipo de perguntas vou retirar-lhe a palavra".
De realçar que o julgamento do caso 500 milhões USD, que tem como réus Valter Filipe, António Samalia Bule Manuel, José Filomeno de Sousa dos Santos e Jorge Gaudens Pontes Sebastião, está a decorrer com pouco público na assistência.
José Filomeno de Sousa dos Santos, uma das principais figuras no julgamento, esteve sempre sozinho nas sessões, não se tendo visto até agora nenhum familiar directo, com a excepção da ex-madrasta, Maria Luísa Abrantes "Milucha", mãe de Tchizé dos Santos, que compareceu na sessão de terça-feira.
O tribunal vai prosseguir na quinta-feira com o interrogatório do réu António Samalia Bule Manuel, ex-diretor do Departamento de Gestão de Reservas do BNA, acusado de peculato.