O calor ainda não chegou à capital angolana, as noites continuam frescas, como se o Cacimbo - que o calendário diz que vai de Maio a Agosto - tivesse invadido a estação das chuvas - de Setembro a Abril - e, em meados de Outubro, apesar de já ter ocorrido alguma pluviosidade, as manhãs e as tardes permanecem estranhamento frescas e secas, sem aquele calor húmido que antecipa as bátegas típicas do clima tropical e subtropical angolano.
Uma das imagens típicas do Cacimbo em Luanda, bem como noutras regiões do país, são os agasalhos que as pessoas que trabalham de noite, como os guardas, polícias... usam, mas que voltam aos armários, o mais tardar em Setembro, excepto este ano que, a meio de Outubro, continuam em uso por causa das baixas temperaturas nocturnas e matinais.
O que está a provocar esta situação é o mesmo fenómeno que está a sujeitar a África Austral à mais violenta seca em 35 anos, e, em alguns países, como a África do Sul, em mais de um século, com fracas colheitas e gado a morrer um pouco por todo o lado e com países como a Namíbia, Suazilândia, Zimbabué, entre outros, a serem obrigados a decretar estado de emergência.
É o "El Nino", um fenómeno climático gerado no oceano Pacífico, que altera as correntes marítimas, gerando fortes chuvas em algumas regiões do globo e seca noutras, criando, ao mesmo tempo, como explicou ao Novo Jornal Online Daniel Graça, especialista doutorado em Ciências Geofísicas, flutuações climáticas que podem ter intervalos de tempo na ordem dos 15 a 30 anos.
O actual clima em Angola é resultado directo dessas flutuações, cuja origem está nas alterações climáticas, onde está englobado o "El Nino", criando surpresa nas pessoas menos informadas sobre o que realmente está a acontecer ao clima em praticamente todo o mundo.
Por outro lado, como explicou também Mfinda Pedro, especialista em climatologia, o fenómeno que está a acontecer em Angola é também resultando de um fenómeno denominado "evento neutro".
Isto, porque o "El Nino" não está a gerar as correntes marítimas que conduzem ao aquecimento desta parte do oceano Atlântico, levando a que também em terra não sucedam as temperaturas a que estamos habituados, pelo menos nos últimos anos, nem a pluviosidade está a ter um comportamento normal.
Mas tanto Daniel Graça como Mfinda Pedro, apesar do primeiro sublinhar que o fenómeno "El Nino" ainda não está suficientemente estudado para que se saiba com clareza todas as consequências dos seus distintos comportamento, são de opinião que o que se está a viver, em matéria de clima, actualmente não é uma anormalidade mas sim resultado de um evento cíclico, que pode ter intervalos longos, por vezes de mais de 30 anos.
Todavia, em relação às chuvas, estes especialistas defendem que em Novembro a situação deve regressar ao seu comportamento regular.
O rasto do "El Nino"
Nos últimos anos, em Angola, especialmente nas províncias do Sul, Huíla, Cunene e Namibe, têm surgido sérios problemas em resultado da prolongada seca, estimando-se que mais de 800 mil pessoas precisem de ajuda permanente, porque as colheitas diminuíram fortemente e o gado está a morrer por falta de água e alimento natural.
Mas as situações mais graves estão a ocorrer em países mais a Sul da sub-região da África Austral, como a Namíbia, onde a fome assume já a condição de severa em algumas regiões, levando o Governo a decretar o estado de emergência, ou ainda no Zimbabué, Lesoto, Suazilândia e Botsuana. E na África do Sul, onde há cem anos não se fazia uma seca como a actual.
As organizações internacionais calculam que mais de 25 milhões de pessoas estejam em sério risco sem um forte apoio dos países da região e da restante comunidade internacional.