Há mais de meio século, estima a agência Reuters, que os EUA, a maior potência económica e o maior produtor e consumidor de crude do mundo, não recorriam com este peso às suas reservas para aliviar a pressão nos mercados, prometendo um milhão de barris diariamente nos próximos quatro meses.

Com esta decisão, a Administração norte-americana alivia ainda o bolso dos cidadãos que estão a pagar a gasolina a preços recorde quando o Presidente Joe Biden tem umas decisivas eleições intercalares este ano e sabe que é a abastecer os seus carros que os eleitores decidem, em grande medida, o seu voto.

Ao anunciar esta medida, Joe Biden arrefeceu fortemente os escaldantes mercados que têm estado a valorizar o barril em permanência nas últimas semanas devido à guerra na Ucrânia considerando que a Rússia, o invasor, é um dos maiores produtores de emergia do mundo e estar sob fortes sanções dos países ocidentais e em risco de ver as suas exportações de crude e de gás interrompidas, pelo menos parcialmente, visto que os EUA já o fizeram totalmente.

Apesar de volumosa, esta libertação de reservas dos EUA não é suficiente para aliviar toda a pressão nos mercados, sendo opinião dos especialistas que só uma acção concertada neste sentido pode levar a uma estabilização dos preços em valores aceitáveis.

E é isso que pode vir a suceder já na sexta-feira quando reunirem de emergência os membros da Agência Internacional de Energia (AIE), para analisar a possibilidade de uma libertação sincronizada de reservas destes países.

O anúncio dos EUA, cujas reservas estratégicas se aproximam dos 700 milhões de barris, coincide com a realização, hoje, quinta-feira, 31, da reunião mensal da OPEP+, a organização que desde 2017 junta os 13 Países Exportadores (OPEP) e 10 desalinhados com a Rússia à frente, para equilibrar os mercados, e que desde Julho de 2021 estão a acrescentar, todos os meses, 400 mil barris por dia, sendo que nestes encontros podem ser redefinidos estes planos.

Até este anúncio a expectativa era de que o "cartel" mantivesse o programa de recuperação da produção, o que tem sido feito há meses, provocando a fúria das economias ocidentais que lidam mal com preços elevados no sector.

E foi isso que sucedeu, de facto. A OPEP+ manteve, na reunião desta quinta-feira,31, o aumento de pouco mais de 400 mil barris por dia para o mês de Maio.

O barril de Brent estava a ser vendido hoje, perto das 12:00, hora de Luanda, a 106 USD, manos 6% que no fecho de quarta-feira, sendo esta já uma das maiores quedas em semanas.

Recorde-se que o barril chegou, depois do início da guerra na Ucrânia, a atingir os 139 USD, a 09 de Março, ficando a escassos 7 dólares do recorde de sempre, 147 USD atingidos em Junho de 2008. Entretanto, com as negociações de paz a decorrer, os mercados têm oscilado.

Porém, hoje foi o dead line estabelecido pelo Presidente russo para fechar a torneira do gás russo à Europa, caso os países não aceitem, como parece ser o caso, pagar em moeda nacional russa, o Rublo.

Se tal vier a suceder, o que só ao final do dia se saberá, os mercados sevem voltar a sobressaltar-se.

O desafio de Putin do "gás por rublos"

Mas se esta semana ficou, até hoje, 31 de Março, quinta-feira, marcada pelas negociações na Turquia e pelo encontro de Lavrov na China com Yi, e, já hoje, com o homólogo indiano, Subrahmanyam Jaishankar, em Nova Deli, a economia mundial pode estar prestes a dar um salto na cadeira, mais um, com o possível fechar da torneira do gás russo para a União Europeia, depois deste exigir o pagamento da matéria-prima na moeda nacional, o Rublo - que com o início do conflito caiu mais de 60% mas já recuperou integralmente dessas perdas iniciais -, mas com a resposta a chegar de imediato: não!.

Putin deu como prazo limite para que os clientes do gás russo se conformarem a esta exigência 31 de Março, hoje. Se cumprir, as grandes economias europeias podem entrar em estado de choque, como é o caso da Alemanha, cuja indústria vive da energia russa, e onde os dirigentes das grandes indústrias já admitiram, como a BASF, que podem ter de fechar a totalidade das suas unidades produtivas, ou com o Governo de Berlin a dizer que terá, eventualmente, de racionar o abastecimento, com perdas de largas centenas de milhares de empregos.

O Presidente da Rússia apresentou hoje ao chanceler alemão, Olaf Scholz, e ao primeiro-ministro italiano, Mario Draghi, as razões para o gás russo ter de ser pago em rublos, garantindo que não prejudicará as empresas europeias.

"A alteração do mecanismo de pagamento é implementada porque, violando as normas do direito internacional, os países membros da União Europeia (UE) congelaram as reservas cambiais do Banco da Rússia", explicou o Kremlin num comunicado onde resume uma conversa telefónica de hoje entre Putin e Scholz.

O Presidente russo também falou com o chefe do governo italiano, a quem explicou igualmente os detalhes desta medida, referiu o Kremlin.

Putin assegurou ao líder alemão que esta decisão "não vai piorar as condições estabelecidas nos contratos para as empresas europeias que importam gás russo", referiu a Presidência russa, que não deu detalhes.

"Foi acordado que haverá conversações adicionais entre peritos de ambos os países", segundo o Kremlin.

A Alemanha tem sido um dos países mais relutantes em incluir o sector energético nas sanções contra Moscovo devido à guerra na Ucrânia, uma vez que 55% do gás que consome provém da Rússia.

Após o anúncio de Putin de exigir em rublos o pagamento pelo gás russo, a UE rejeitou categoricamente esta exigência, dizendo que constitui uma violação dos contratos existentes.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro, depois de semanas de impaciente expectativa, as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional, criticando fortemente o avanço desta organização de defesa para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de KIev da soberania russa da Península da Crimeia, integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1992, com o colapso da União Soviética.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios...

Milhares de mortos e feridos e mais de 4 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.