Por detrás desta valorização recorde está, como têm chamado à atenção alguns analistas do sector petrolífero, em primeiro lugar o odor no ar a fim de crise económica gerada pela pandemia da Covid-19 com o surgimento de várias vacinas que derrotam o Sars CoV-2, e segundo a mudança de Presidente nos EUA, a maior economia do mundo e o maior consumidor de crude do planeta, porque o democrata Joe Biden é mais receptivo à injecção de estímulos financeiros à economia do igualmente maior produtor de crude do mundo, e em terceiro a verificação de que os stocks nas grandes economias estão em declínio.
Mas não é só de disso que vive este momento festivo no sector do petróleo, especialmente para os países exportadores mais dependentes da matéria-prima para o fortalecimento da sua economia, como é o caso de Angola.
Também para ele contribuiu de forma substancial a decisão unilateral e estratégica da Arábia Saudita de avançar para um corte adicional à produção de 1 milhão de barris por dia (mbpd) em cima dos cortes acordados no seio da OPEP+, organização que agrega a OPEP e um grupo de não-alinhados liderados pela Rússia.
Isto, como o Novo Jornal tem vindo a destacar, a OPEP+, que desde 2017 tem agregado forças com a Rússia, o outro gigante, a par dos sauditas e dos norte-americanos, da produção mundial, mas que, desde Março de 2020, por causa da crise pandémica, tem em curso um substancial programa de redução da produção para reequilibrar os mercados, acaba de decidir por protelar por mais dois meses o aumento da produção em 500 mil bpd como estava inicialmente estabelecido.
Assim, na reunião mensal que terminou na terça-feira, com Angola já na qualidade de presidente rotativo da OPEP, ficou definido, depois de praticamente dois dias de discussão, os membros da OPEP+, não agregar os esperados 500 mil barris/dia mas sim apenas 75 mil bpd, o que seria melhor que o definido em Dezembro, mas um golpe nas expectativas dos mercados, que ansiavam por algo mais influenciador para a valorização da matéria-prima.
Em Dezembro, é importante lembrar, o "cartel" tinha decidido que a 01 de Janeiro, em vez de um aumento de uma só vez, como era o plano inicialmente desenhado, no início de 2020, de 2 milhões de barris por dia (mbpd), aumentaria a produção em 500 mil bpd e assim sucessivamente até chegar a 7,2 mbpd.
Ou seja, com este acordo, em Março, se não forem introduzidas quaisquer alterações - recorde-se que a OPEP+ tem acordado reunir todos os meses, nos primeiros dias -, em vez de a OPEP+ estar a enxugar a produção em 5,7 mbpd, como se pensava ir ser há uns meses, estará a retirar 7,05 mbpd, enquanto em Fevereiro se fixará nos 7,125 mbpd e este mês de Janeiro, não irá além dos 7,2 mbpdm ao que se acrescenta a diminuição unilateral e excepcional saudita de 1 mbpd em Fevereiro e Março.
O efeito Biden
Mas há ainda a possibilidade, claramente admitida pelos analistas, de que a Administração Biden é mais amiga do ambiente, que vai retomar a adesão dos EUA ao Acordo de Paris, que visa reduzir drasticamente a emissão de gases com efeito de estufa - o crude é um dos maiores responsáveis mundiais por isso - e que não vai ser tão amiga dos produtores de fracking norte-americanos porque se trata de uma indústria altamente poluente devido ao método que usa e que passa por injectar água e químicos em alta pressão e a grandes profundidas para explodir a rocha de xisto e dela subtrair crude gás natural.
Por definir esta ainda que tipo de efeito podem ter os graves tumultos ocorridos nas últimas horas no Congresso norte-americano a escassos dias de Joe Biden assumir a Casa Branca.
Por outro lado, a moeda norte-americana está a perder valor face à moeda europeia, o euro, mas também ao iene japonês, o que tende a influenciar a subida do valor do barril que é, praticamente sem excepção, negociado em dólares.
Angola a saborear o momento, mas pouco...
Este cenário de robusto crescimento do valor do crude, a manter-se, como tudo aponta que venha a suceder, é um momento extraordinário para Angola, apesar de os valores em questão não se compararem com aqueles que, no passado, a partir de 2008, levou o País a ser o maior produtor africano durante largos meses, com cerca de 1,8 mbpd, e a viver uma bonança difícil de repetir, com o barril, como exemplo, a chegar aos 147 USD no Verão desse mesmo ano.
A produção actual está abaixo dos 1,3 mbpd e em constante declínio devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016.
Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção demora a arrancar para os patamares mais próximos daqueles que se viram no passado.
Para já, com o barril da matéria-prima nos 53 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de 20 USD em cima dos 33 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.
O crude é ainda responsável por mais de 94% das exportações angolanas, mais de 50% do PIB e representa 60% das receitas do Executivo para poder gerir as necessidades da governação, o que, face a uma lenta e demorada diversificação da economia nacional, se traduz numa mais optimista entrada no novo ano e nova década do século XXI.