Contra as expectativas criadas ao longo dos últimos dois anos, a OPEP+, organização que agrega os 12 membros dos Países Exportadores (OPEP) e a Rússia, ao invés de estar a retirar quantidade em circulação, aumentou recentemente a oferta.
Esta constatação coincide com o abandono de Angola da OPEP, curiosamente usando como justificação oficial os limites de quotas de produção impostos pelo "cartel", mas tem ainda por detrás uma jogada arriscada da Arábia Saudita, o gigante mundial do sector, que acaba de anunciar um corte no preço das suas ramas de exportação para o continente asiático.
A descer perto de 1,1 por cento nesta segunda-feira, 08, o barril de Brent, que serve de referência principal para as ramas exportadas por Angola, estava a valer em Londres 77,9 USD, perto das 09:10, hora de Luanda.
Esta descida reflecte essencialmente, todavia, o aumento de 70.000 barris/dia verificado pela Reuters na produção da OPEP, referente ao mês de Dezembro último e um corte acentuado do preço do "Arab Light" direccionado para a Ásia num tomo que atira o barril desta rama para o equivalente de há quase dois anos e meio.
Com o mundo à beira de um forte crescimento da oferta oriunda das novas descobertas, especialmente na Ámérica do Sul, na Guiana, de onde em breve chegará aos mercados mais 3 mbp, e do Brasil, com um aumento da sua produção em valores muito semelhante, e o não menos importante crescendo da produção da área do fraking norte-americano, as perspectivas para a matéria-prima começam a ser de encolhimento.
E pode ainda piorar se, tal como já o anunciou publicamente, o antigo Presidente Donald Trump ganhar as eleições de 05 de Novembro deste ano, como as sondagens o indicam de forma clara, embora tenha de se ver livre dos vários processos judiciais que correm nos tribunais, os EUA vão apostar como nunca na produção do temível, altamente poluente e destrutivo "petróleo de xisto".
Todavia, este cenário está ameaçado pelo potencial de alastramento do conflito na Faixa de Gaza para o resto do Médio Oriente (ver links em baixo nesta página), onde cresce o atrito pela acção de grupos e movimentos armados apoiados pelo Irão, como o Hezbollah, no sul do Líbano, os Houthis, no Iémen, ou o Hamas e a Jihad Islâmica, na Palestina, além das várias milícias pró-iranianas que mantém fogo cerrado sobre as bases norte-americanas no Iraque e na Síria...
Como justificação para essa iminente alteração do contexto e do que se pode esperar para o sector do crude, e energético, em mais larga abordagem, um alargamento do conflito entre Israel e o Hamas, toda a geografia que abrange o Irão, Iraque, Síria, directamente, e indirectamente, Arábia Saudita, EAU, Qatar e Kuwait... entraria em convulsão e a disrupção do fornecimento de crude seria inevitável, o que provocaria danos incomensuráveis considerando os mais de 35% de crude global produzidos nesta região.
A travar algum pânico está o que parece ser uma aposta sólida dos EUA em travar essa escalada e alastramento do conflito, como o indica a 4ª visita relâmpago do secretário de Estado, Antony Blinken, à região, que ainda decorre e abrange Israel, Turquia, Arábia Saudita, Qatar, Egipto, Jordânia...
Á chegada, Blinken não escondeu ao que anda: impedir a todo o custo a expansão da guerra israelo/palestina para o vasto Médio Oriente.
Do seu sucesso, ou insucesso, pode depender de forma devastadora a estabilidade dos mercados petrolíferos e o equilíbrio entre a oferta e a procura.
Para Angola, as contas são estas...
Para Angola, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, ter o Brent nos 77 USD não permite diluir os efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista, até porque o país enfrenta também o problema da persistente redução da produção diária, mas, ainda assim, dentro do valor com que foi elaborado o OGE 2024.
Com OGE 2024 elaborado com um valor de referência médio para o barril de 65 USD, estes valores actuais permitem um relativo optimismo, mas aumentar a produção é o factor-chave, o que ficou mais fácil depois de Angola ter, em Dezembro passado, anunciado a saída de membro da OPEP, o que deixa um eventual acréscimo da produção fora dos limites impostos pelo cartel aos seus membros como forma de manter os mercados equilibrados entre oferta e procura.
O crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.
O Presidente da República, João Lourenço, deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de manter a produção nacional acima de 1,1 mbpd com os campos "Ndola Sul", "Agogo Fuel ou os projectos "Begónia", "Cameia" e "Golfinho", gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.
O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.
Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.
Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.
A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.