O cessar-fogo parcial entre russos e ucranianos, negociado pelo Presidente norte-americano, está morto e o fracasso de Donald Trump na sua "promessa" de acabar rapidamente com o conflito no leste europeu é já um embaraço na Casa Branca que europeus estão a querer aproveitar.
O travão nas hostilidades entre a Rússia e a Ucrânia visa(va) apenas as infra-estruturas energéticas e o corredor comercial no Mar Negro, mas durou pouco, porque apenas algumas horas tinham passado quando os ataques queimaram o papel onde estava escrito o acordo.
A 25 de Março o acordo entre Kiev e Moscovo ficou relativamente consolidado, mas russos e ucranianos não se encontraram uma única vez para discutir a proposta dos norte-americanos, mas o mês ainda não tinha acabada e já se tinha percebido que o acordo estava morto.
Dos dois lados da barricada foram disparadas rajadas de acusações sobre quem fulminou primeiro o acordo que seria a primeira vitória internacional de Donald Trump, mesmo que parcial, porque a sua promessa mais sonora era mesmo acabar com a guerra em 24 horas.
Nem 24 horas nem dois meses e meio, que é o tempo que passou desde que Donald Trump chegou à Casa Branca... o sangue continua a jorrar nas trincheiras do leste europeu, com a Rússia a somar territórios na linha da frente, mesmo que longe ainda dos objectivos.
Se a Ucrânia está à beira de perder a guerra nas trincheiras, e a Rússia pode estar a caminho de conseguir a totalidade dos territórios das quatro províncias anexadas em 2022 - Lugansk, já tomada, Donetsk, Zaporizhia e Kherson, com áreas significativas ainda sob controlo de Kiev -, certo é que Donald Trump é, para já, o único com a derrota cravado no seu prestígio.
Alguns analistas admitem mesmo que o insucesso na missão de acabar com a guerra entre russos e ucranianos deu muito do gás com que a Casa Branca declarou a guerra de tarifas ao mundo, com excepção da Rússia e dos seus dois maiores aliados, a Bielorrússia e a Coreia do Norte.
E se essa foi uma das razões, então aí Trump teve sucesso, porque já quase ninguém fala da morte do cessar-fogo na Ucrânia, com Moscovo e Kiev a atirarem as responsabilidades para o outro lado, mas sem que se possa dizer com clareza quem o fez primeiro...
Eis que o falcão Macron ganha penas de pomba outra vez
Com as infra-estruturas energéticas a serem alvo de drones e misseis de um e do outro lado, na geografia do conflito não abrangida pelas negociações do cessar-fogo que os norte-americanos conduziram com Kiev e Moscovo na Arábia Saudita, nada mudou e as forças russas levam uma forte vantagem com uma barreira incessante de ataques contra as forças ucranianas.
Já dado oficiosamente como morto, o cessar-fogo dos americanos está a ser visto na Europa ocidental como um balsamo para a diplomacia francesa, com o Presidente Emmanuel Macron a querer, de novo, assumir as rédeas das conversações com o Kremlin.
Pelo menos é isso que avança o britânico The Telegraph, que divulgou uma notícia sobre um plano de Paris para liderar o diálogo que se vai abrir em breve com o Presidente russo, Vladinir Putin, naquilo que parece ser uma tentativa de aproveitar o fracasso de Washington para ganhar espaço de manobra nos esforços diplomáticos para acabar com o conflito.
Macron está assim a emergir de novo como a pomba da paz depois de já o ter feito ao longo de 2023 e que, em 2024, ganhou asas de falcão de guerra, como ficou claro ao liderar as vozes que defenderam o envio de forças da NATO para a Ucrânia (ver links em baixo).
Nesta nova postura de pacifista, Emmanuel Macron assume que o fim do conflito só pode ser conseguido com base num diálogo com Moscovo, ao mesmo tempo que deixa entender que recusar esse diálogo com o Kremlin foi um erro.
Macron e Starmer querem uma guerra com a Rússia?
O Presidente francês deverá liderar, segundo fontes do Governo de Paris citadas pelo jornal londrino no Sábado, 05,, essa frente de conversações com a Rússia em nome da denominada "coligação de vontades" para apoiar a Ucrânia, num confronto claro com o que defende o primeiro-ministro britânico Keir Starmer.
Isto sucede quando Macron e Starmer têm estado juntos na defesa da ideia deo envio de militares dos seus países para a Ucrânia, mesmo que a Rússia mantenha que quaisquer tropas ocidentais que entrem na Ucrânia serão legitimamente visadas pelas forças russas.
O que, como defendeu, na CNN Portugal, o analista militar major-general Agostinho Costa, seria a antecâmara de uma guerra entre a NATO e a Rússia, porque Moscovo já avisou que não tremerá no gatilho para disparar contra forças francesas e britânicas que entrem na Ucrânia.
Mas parece cada vez mais que entre os europeus começa a surgir uma vaga de fundo que navega contra a postura "oficial" dos lideres europeus, como Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, que apostam tudo no confronto abrasivo com Moscovo.
É que, além de Macron ter, ao que tudo indica, voltado a querer falar com Putin, também o Presidente da Finlândia, Alexander Stubb, até há pouco tempo um dos falcões de guerra europeus, veio agora defender também que Paris e Londres devem falar também com os russos.
Para já, estas movimentações tendem a parecer, como no passado, manobras tácticas para perceber eventuais fragilidades do lado russo, que poderiam surgir com o anúncio de vontade de falar com Macron apenas com base em notícias de jornais que depois podem ser facilmente desmentidas.
Se assim foi, o Kremlin não caiu na ratoeira, porque Dmitri Peskov, o porta-voz de Vladimir Putin, já veio dizer que o Kremlin desconhece quaisquer iniciativas de Paris para conversar, depois de nas últimas semanas a Rússia insistir que o diálogo que mantém sobre a guerra na Ucrânia é com os Estados Unidos e que é nesse patamar que mantém os seus esforços diplomáticos.
Até porque, as declarações das últimas horas de Macron mostram que, no fim das contas, este mantém uma asa de falcão sobressalente para usar sempre que necessário, como ficou claro quando, já neste Domingo, voltou a ameaçar Putin com uma "acção forte" se os russos continuarem a "recusar a paz".
Com estas afirmações, o Chefe de Estado francês acaba por sublinhar que a sua visão assenta na ideia de que o cessar-fogo foi arrasado pelos russos e não pelos ucranianos, o que permite a alguns analistas lembrar que foi precisamente a "morte" do cessar-fogo mediado pelos EUA que lhe permitiu, e aos europeus, voltar a ganhar algum protagonismo.
Foi no X que Macron escreveu, no Domingo, 06, que "os ataques da Rússia têm de acabar" que é preciso um cessar-fogo "o mais rapidamente possível" bem como uma "acção forte" se a Rússia "continuar a recusar a paz".
Macron disse mesmo que Kiev aceitou o cessar-fogo proposto há um mês pelo Presidente Donald Trump e os russos estão a boicotá-lo, ignorando totalmente que os russos também recusam a responsabilidade de terem sido eles a terraplanar a cessão das hostilidades mediada pelos norte-americanos, acusando os ucranianos de não terem interesse em fazê-lo.
Alguns analistas apontam mesmo para a ideia de que nem Kiev nem Bruxelas querem um cessar-fogo bem sucedido pela mediação norte-americana porque isso significaria que nem o Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky nem os lideres europeus teriam qualquer relevância futura no desenho do futuro da Ucrânia.