A Riade, capital saudita, já chegaram os elementos avançados da equipa negocial dos EUA, que inclui o secretário de Estado, Marco Rubio, o conselheiro para a Segurança, Mike Waltz, e ainda o enviado especial do Presidente norte-americano para o Médio Oriente, Steve Witkoff.

Da parte russa ainda não foram divulgados os nomes que vão estar nesta fase da preparação do tête-à-tête entre Donald Trump e o Presidente russo, Vladimir Putin, que já se sabe ir ter lugar "nos próximos dias" na Arábia Saudita, mas será, seguramente, uma equipa de igual peso.

Assim, é previsível que se desloque para os preparativos do encontro Trump-Putin em Riade, a primeira vez que tal acontece em anos sem ser no território europeu, entre lideres das duas grandes potências militares, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, a liderar a comitiva russa, sendo acompanhado por Yury Ushakov, assessor principal do Presidente russo para os assuntos de política externa.

Este encontro histórico entre os dois Presidentes da Rússia e dos EUA, o primeiro em mais de três anos, acontece quando falta uma semana para serem cumpridos os três anos da invasão russa da Ucrânia, e no qual tanto Putin como Trump querem abordar outros problemas além do conflito no leste europeu.

Da parte russa já se sabe que o objectivo é fazer deste encontro uma plataforma de diálogo bilateral para nela colocar em discussão um plano de segurança abrangente para a Europa e Eurásia, além de voltar a desenhar um programa de controlo de armamento nuclear, bem como estabelecer os contornos do futuro relacionamento entre russos e americanos.

A Tass, agência de notícias russa, deu como certa uma notícia do site norte-americano Axios, que aponta para esta terça-feira, 18, o primeiro encontro entre as delegações enviadas para Riade pela Casa Branca e pelo Kremlin.

Nesta já certa nova etapa das relações entre EUA e a Federação Russa sobressai claramente a secundarização da Europa Ocidental no processo negocial para acabar com o conflito na Ucrânia e do Presidente ucraniano, a quem russos não atribuem legitimidade democrática devido à falha no calendário eleitoral e Trump não esquece que Volodymyr Zelensky apostou tudo ao apoiar os democratas nas eleições norte-americanas.

Alias, Trump não esquece que Zelensky queria continuar a ter na Casa Branca um democrata e não o seu regresso ao poder, e também mostra não ter esquecido que os acuais governantes europeus, tanto da União Europeia como dos seus membros, apostaram as fichas todas nos seus adversários democratas nas eleições de Novembro do ano passado.

Europeus afastados

Este ruidoso afastamento dos europeus do palco onde se discute o destino do mundo não passou em branco nos corredores do poder da velha Europa e o Presidente francês, Emmanuel Macron convocou para esta segunda-feira, 17, um encontro em Paris com os principais lideres europeus.

A agenda tem apenas um ponto: como lidar com o afastamento norte-americano da Europa Ocidental e garantir que o plano de paz para a Ucrânia não é desenhado apenas por russos e americanos.

Washington, como ficou evidente durante a Conferência de Segurança de Munique, que teve lugar esta semana que passou, não apenas se está a afastar para o espaço estratégico do Indo-Pacífico como está numa fase em que dos europeus e ucranianos apenas quer que paguem tudo o que os americanos meterem em dinheiro e armas no conflito ucraniano.

E isso passa por exigir que os aliados da NATO aumentem os seus gastos com a defesa para 5% do PIB para gastar em armas "Made in USA", e dos ucranianos querem garantido em papel assinado o acesso às riquezas minerais do seu subsolo para reaver os 300 mil milhões USD gastos nestes três anos de guerra.

Para já, com esta reunião em Paris, o Presidente francês arrisca-se a cumprir um dos objectivos agora comuns a Trump e Putin, que é fragilizar a solidez da União Europeia, que começou com o desligamento da poderosa indústria alemã aos gás e crude baratos da Rússia no contexto das sanções aplicadas a Moscovo no decurso da guerra.

E com a desvitalização da economia alemã, que é o motor da economia europeia, todo o continente europeu, especialmente a geografia mais ocidental, sofre pesadamente, o que retira capacidade negocial e impositiva a Bruxelas e abre espaço para a afirmação nacional dos vários actores europeus.

Igualmente relevante neste contexto é a crescente convicção entre os analistas que Donald Trump já escolheu o lado dos Russos ao retirar do frontispício negocial em Riade Keith Kellogg, o seu enviado especial para o leste europeu.

E isso é relevanteporque Kellogg estava a conduzir as negociações sob o chapéu do seu plano de paz que desagrada totalmente aos russos, e que passa pelo congelamento do conflito e o envio de uma força ocidental para a linha da frente como garantia de segurança para Kiev.

Essa proposta nem sequer chegou a ser equacionada pelos russos que rejeitam totalmente a presença de forças ocidentais na Ucrânia como, de resto, não querem sequer ouvir falar numa adesão posterior de Kiev à NATO.

O que se perfila como epílogo para as negociações de Riade é que EUA aceitem que mais de 20% da Ucrânia - as regiões anexadas oficialmente entre 2014 e 2022 - passe a ser definitivamente parte da Rússia, incluindo a área que está actualmente a ser conquistada a grande velocidade no decurso da guerra...

Que a Ucrânia fique de fora da NATO para sempre, que as forças armadas ucranianas sejam limitadas e não reforçadas no futuro pelos países da NATO, tudo devidamente conformado em acordos sólidos para não suceder como nos Acordos de Minsk I e II, de 2014 e 2015, que foram usados para enganar a parte russo enquanto Kiev era fortemente preparada para uma guerra futuro com os russos.~.

Mas que quer Trump dos russos?

O mais provável é que o Presidente norte-americano esteja a cumprir uma missão de pura diplomacia estratégica ao ceder a Moscovo em tudo o que o Kremlin quiser no que diz respeito à Europa, de onde os americanos parecem estar em "fade out" estratégico, com vista ao bem maior para Washington na sua nova visão do mundo.

Que é tentar desligar a Rússia dos chineses, destruindo a parceria estratégica que Pequim e Moscovo ergueram nos últimos anos, tirando viço aos BRICS, para depois, mais tarde, os EUA "atacarem" aquela que é a grande ameaça à sua hegemonia planetária, a China, sabendo que Pequim, com a sua gigantesca capacidade industrial, ligada aos infindáveis recursos naturais russos, é praticamente invencível.

O problema mais sério, como começa a ser perigosamente claro, é se a parceria estratégica entre Pequim e Moscovo é efectivamente indestrutível, como ambos têm sublinhado, e Washington vier a concluir que, afinal, a Europa Ocidental é insubstituível enquanto aliado estratégico dos EUA no contexto dos seus planos para o... mundo.

E aí sim, aí volta a emergir das profundezas da história o risco de um confronto ilimitado entre as duas superpotências nucleares com epicentro no leste europeu e não no Indo-Pacífico, como muitos temem actualmente.

E é provável que na Europa, em Paris, onde estão reunidos os lideres europeus que responderam ao convite de Emmanuel Macron, se analise com cuidado redobrado a possibilidade de Donald Trump ficar furioso com a recusa de Moscovo se desligar de Pequim...