Vai ser a 20 de Janeiro que Joe Biden assumirá o cargo de Presidente dos EUA, o que significa que nos próximos pouco mais de dois meses, Donald Trump poderá exercer o cargo quase sem restrições, sendo que a história regista que os Presidentes que estão para deixar o cargo, iniciam um processo de transição mantendo o Presidente eleito a par das suas decisões e aconselhando-se mesmo com este. Nada garante que Trump terá essa cortesia com Biden. E nem sequer assume a derrota. Foi jogar golfe.

Trump já veio a público, antes de dedicar o dia de hoje ao golfe, o seu desporto favorito, exortar Joe Biden a não reclamar tão depressa o cargo, porque o processo de contestação dos resultados pela via judicial "ainda só agora começou". E, enquanto a eleição se prolongar nos tribunais, apesar da avassaladora derrota de Trump, que obterá, mais de 300 votos do Colégio Eleitoral, onde só carecia de 270, de um total de 538, para ser o 46º Presidente dos Estados Unidos.

Trump diz que vai exigir que seja feita justiça e que os americanos tenham a eleição que merecem e seja feita justiça confirmando a sua vitória.

Para além da dúvida sobre o que vai Trump fazer agora, sendo que o que os analistas esperam é que a batalha judicial possa ser intensa e brutal, resta ainda saber se nestes próximos quase dois meses, até ao dia da tomada de posse de Biden, vai usar os seus poderes para qualquer tipo de vingança sobre os seus adversários.

O que BIden vai fazer a partir do 1º dia na Casa Branca

Já Biden, assim que assumir o cargo, em Janeiro, sendo que a 14 de Dezembro é o Colégio Eleitoral que reúne para consumar a eleição do democrata, tem as suas quatro prioridades bem definidas: o combate a pandemia, que foi literalmente desconsiderada pelo ainda Presidente Trump, é a primeira e a mais urgente.

Mas Joe Biden já deixou claro que a economia, o racismo e as alterações climáticas, são igualmente palavras escritas no topo da sua agenda para o arranque do seu cargo enquanto 46º Presidente dos EUA.

Claro está ainda que os EUA vão estancar o processo de saída do Acordo de Paris, onde o mundo se uniu para procurar soluções para combater as emissões de gases com efeito de estufa, e ainda a reinserção dos Estados Unidos da América no concerto das Nações face à Organização Mundial de Saúde (OMS), que Trump deixou de financiar alegando que este organismo das Nações Unidas - ONU - favoreceu a China no seu argumentário de contestação a qualquer culpa na propagação da pandemia da Covid-19, ou a UNESCO, oura das agências da ONU que viram os maus fígados de Donald Trump para aquilo que são os suportes globais do multilateralismo.

É ainda de esperar, segundo os analistas, uma recuperação do olhar norte-americano sobre o resto do mundo, nomeadamente daquela parte do mundo em desenvolvimento, como o continente africano, de onde saíram quase literalmente, nomeadamente em questões de política externa, como o apoio à democracia e às organizações que por ela se batem, especialmente no contexto dos Direitos Humanos, aos quais a Administração Trump dedicou um absoluto alheamento.

A história breve destas eleições

Logo após o dia da votação, 03 de Novembro, terça-feira, quando começaram a ser contados os mais de 100 milhões de votos que foram enviados pelo correio ou que foram recolhidos antecipadamente, se percebeu que o democrata Joe Biden estava em condições de recuperar da desvantagem que a votação do dia mostrava, a favor de Donald Trump.

Nos dois dias seguintes, quarta-feira e quinta-feira, as contas foram mantendo um coerente crescimento da votação em Joe Biden, acabando por nas últimas horas se concentrarem todas as atenções nestes quatro estado: Pensilvânia, que, com os seus 20 votos para o Colégio Eleitoral, bastava para que o democrata ganhasse, como sucedeu, estas eleições, a Georgia, com 16 votos, o Arizona, com 11, e o Nevada, com seis.

Em todos eles, Trump estava a perder o universo dos media de Murdoch, onde pontificam a Fox News, o New York Post e o Wall Street Journal, cujo apoio ao Presidente na campanha e à sua Administração, nos últimos quatro anos, foi massivo, deram início a um processo de aligeirar da pesada carga e colagem a Trump nestes anos, começando a divulgar peças contendo a ideia de que o "seu" candidato já perdera a Casa Branca e que estava a chegar o momento de aceitar a derrota com dignidade.

Mas não é isso que parece estar na mente de Donald Trump, que se tem multiplicado em acusações de fraude generalizada, que se fossem contados apenas os votos legais, teria ganho as eleições e a exigir recontagens em pelo menos dois destes estados, nem da sua equipa mais próxima, onde o seu filho Eric, está a acusar o partido republicano de fraco apoio à contestação dos resultados eleitorais e o seu principal conselheiro jurídico, Rudy Giuliani, o antigo "mayor" de Nova Iorque, ter acusado os democratas de "roubarem a eleição" com votos que "podem estar a chegar do planeta Marte", referindo-se aos votos enviados pelo correio.

Esta acusação foi contestada por todos os analistas e media norte-americanos, porque se sabia há vários meses que os eleitores democratas iriam votar pelo correio ou de forma antecipada devido à pandemia da Covid-19 enquanto os republicanos, incitados por Trump a ignorar a pandemia, concentraram o seu voto no dia das eleições, terça-feira, 03.

Recorde-se que o leque vasto de mentiras que Trump debitou no discurso que fez na Casa Branca levou as maiores estações de tv norte-americanas a cortar o sinal alegando que não podiam manter o ar tantas mentiras, incluindo a FOX News.

Entretanto, de Wilmington, no estado do Delaware, onde tem o seu quartel-general, Joe Biden, depois de ter pedido calma aos norte-americanos, de ter avançado que não reclamaria a vitória até que todos os votos estivessem contados, e apelando a que os adversários políticos deixassem de ser vistos como inimigos, hoje mostrou-se mais próximo do derradeiro passo que falta: assumir que é o 46º Presidente dos EUA, finalmente deixou passar e consolidar a ideia de que estava já na condição de Presidente eleito.

Recorde-se que o sistema eleitoral norte-americano é substancialmente distinto do angolano, por exemplo, porque os eleitores dos 50 estados votam para eleger os chamados "grandes eleitores", dependendo a quantidade da sua população, que, por sua vez, em meados de Dezembro consolidam o vencedor, que precisa dos 270 votos de um total de 538 grandes eleitores.

Joe Biden e a sua candidata a vice-Presidente, Kamala Harris, estão, assim, a um passo formal da Casa Branca. Mas existe ainda a ameaça das batalhas judiciais, e os republicanos atrasarem este processo por vários semanas, como sucedeu, por exemplo, há 20 anos, com a disputa entre Al Gore e George W. Bush.

Para já, certo, certo é que estas são eleições históricas, não só porque sucede a rara situação de que um Presidente não consegue a reeleição, como foi, de longe, a votação mais participada dos 231 anos de história da democracia dos EUA, com mais de 74 milhões de eleitores a escolherem Biden e mais de 70 milhões a optarem por Trump.

Sobressai ainda o facto de mesmo que Trump tivesse ganho com os seu 70,230 milhões de votos, seria igualmente o mais votado de sempre, ficando bastante à frente de Barack Obama, em 2008, que teve então uma votação recorde de à volta de 69 milhões.