Para Marcolino Moco, o problema da exclusão da maioria angolana é provocado "por meia dúzia de pessoas: Família do Presidente da República, e governantes", alguns deles generais que, disse, já não o deveriam ser por exercerem funções ministeriais.
"São esses que efectivamente preocupam. Depois há aqueles que enriqueceram naquelas circunstâncias da guerra e hoje têm empreendimentos em Angola. Podem ter empreendimentos fora, mas não são tão impactantes, ao ponto de condicionar governos. Governos não. Condicionou sobretudo o Governo português. Isso é, efectivamente, só a família presidencial e pouco mais", acusou.
"Nunca se perguntou de onde saiu tanto dinheiro para uma família comprar bancos, outros sectores estratégicos de Portugal. Isso era importante saber", disse, aludindo à recente directiva do Banco Central Europeu (BCE), que exigiu a Lisboa menor exposição financeira a capitais angolanos.
O antigo primeiro-ministro acrescenta que não foi por falta de avisos que se chegou a este ponto. "Já tinha alertado que essa permissão de Portugal de vender sectores estratégicos a «angolanos» - por que não são uma classe empresarial verdadeira, são homens e mulheres do poder, que se eternizam no poder -, havia de custar a Portugal. Acho que não me enganei, porque é justamente isso que está a acontecer hoje", referiu, lembrando que os seus alertas caíram em saco-roto.
"Perguntei, então, se a UE (União Europeia) não tinha uma forma de ajudar Portugal a livrar-se desta situação que iria criar problemas. Ninguém me ouviu na altura. Era a altura do entusiasmo, do maná, mas nunca entendi que se chamasse crescimento económico à valorização, que tinha sempre de ser temporária, de um produto único para um país. Nunca entendi", sublinhou Marcolino Moco, contundente nas críticas a Isabel dos Santos.
"Em Angola, Isabel continua a não parar. Recebeu as obras da cidade de Luanda e uns tantos milhões, enquanto há problemas sérios com os hospitais, com as cidades, que infelizmente são governadas a partir do problema da centralização. Mesmo perante esta situação, Isabel continua a somar e a seguir. O Benfica some e segue, mas agora digo a Isabel soma e segue", frisou.
"Há mortos nos hospitais, os cadáveres não cabem nas morgues e ela abre grandes centros comerciais, recebe de mão beijada obras para estradas que não têm validade imediata. O que se passa nos bairros de Luanda é uma calamidade", reforçou.
"Manipulação de conceitos" nas relações com Portugal
Segundo Marcolino Moco, há uma "manipulação de conceitos" em torno das relações luso-angolanas, sobretudo por parte de Luanda, que "politiza" problemas que existem entre pessoas e empresas.
"O que é mais curioso, algo masoquista, é que alguma elite portuguesa acha que deve ser assim. Que os tais «angolanos» devem exigir tudo o quiserem perante Portugal, como se Portugal tivesse alguma culpa", argumentou.
"Agora estamos nesta situação e parece que Portugal já começa a sentir que a relação com África não pode continuar com esta relação do tipo «chico-esperteza», mas sim numa base de respeito para os povos", concluiu
Já sobre o apoio do FMI, Marcolino Moco adianta que não sabe se "vai resolver ou agravar o problema de Angola", embora acredite que "o mais certo é que agrave" a situação.
Para o antigo primeiro-ministro, este tipo de intervenção não é a adequada. "Repugna-me um pouco abordar as coisas do tipo pontual. Quem quiser ver a África a progredir não vale a pena perder tempo com essas questões pontuais. "O próprio contexto africano está errado. A própria estrutura do Estado africano está errada. Há a exclusão. Quem chega ao poder, provavelmente está conotado com um grupo específico, não deixa lugar a mais ninguém", lamentou.