Entre os integracionistas, que defendiam a criação de um Estado africano com governo e exército únicos, destacam-se Sekou Touré (Guiné Conackry), Kwame Nkrumah (Ghana), Mohamed V (Marrocos), Madibo Keita (Mali) Abdel Nasser (Egipto) e outros.
Enquanto da parte dos vencedores, os soberanistas pró-ocidentais que se opunham a qualquer tipo de integração, figuram nomes como Leopold Sedar Senghor (Senegal), Houphouet Boigny (Costa do Marfim), William Tubman (Libéria), Nnamdi Azkiwe (Nigéria) e outros.
Desde o seu nascimento, a 25 de Maio de 1963, a Organização de Unidade Africana (OUA), transformada em 2002 em UA, nunca conseguiu dar o salto para a integração como caminho para o desenvolvimento das sociedades africanas e prosperidade dos seus povos.
Para minorar parte dessa falha, dando um passo no sentido da integração económica, África criou, há sete anos, a Zona de Comércio Livre Continental Africana (ZCLCA), maior área de comércio livre do Mundo, abrangendo a quase totalidade do continente.
Em termos imediatos, o acordo da ZCLCA aumentaria o comércio intra-africano em mais de 50%, eliminando as barreiras alfandegárias e outras entre os países membros.
No entanto, apesar das promessas no sentido da efectivação do acordo e da UA ser a única organização do Mundo composta por todos os países de um continente, poucos ou nenhum progresso foram feitos e o comércio intra-africano continua muito baixo do acordado, representando apenas 16%, segundo dados de 2023 do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD).
Para África, que precisa de deixar de ser mero exportador de matérias-primas e receptor de produtos transformados, a ZCLCA mais do que uma necessidade, representa também um imperativo de sobrevivência, num mundo regulado por relações comerciais e económicas muito desiguais.
Apesar de assinado e ratificado pela quase totalidade dos Estados membros, esse pequeno gesto, que devia ser transformado num gigante passo rumo à integração africana, está a ser implementado muito lentamente por alguns e ignorado por outros, também resultado das divisões entre favoráveis e opositores à integração africana.
Os anti-integração que, certamente, assinam diferentes acordos da UA para ficarem bem na fotografia, ignoram que, de acordo com a sabedoria africana, "quem quer ir rápido, vai sozinho, mas quem quer ir longe, vai em grupo" ou que, na expressão de Julius Nyerere, a "unidade não nos tornará ricos, mas pode dificultar que África e os povos africanos sejam desconsiderados".
Julius Nyerere, líder panafricanista, fundador da Tanzânia, conclui ainda que a unidade "irá, portanto, aumentar a eficácia das decisões que tomamos e tentamos implementar para o nosso desenvolvimento".
Integração também é necessária para combater a pobreza e a instabilidade em África, continente que dos actuais 1,4 mil milhões de habitantes passará, em 2050, para cerca do dobro, representando 25% da população activa mundial e constituindo-se na grande força do crescimento económico do século.
Dados que fazem de África, berço da Humanidade, o continente do e com futuro, que precisa de se assumir como tal, sem medo e rejeitando as pressões neo-coloniais contra a integração.
Por isso, os políticos africanos deviam olhar para a sequência de golpes de Estado continentais, analisando as suas causas que vão da miséria, falta de dignidade em que vive a maior parte dos povos africanos, às tentativas de eternização no poder de governantes que representam o retrocesso político, social, económico e cultural, ou seja, civilizacional.
Em vez disso, políticos, organizações e agrupamentos africanos, reproduzindo ipsis verbis os ditames externos, condenam os autores dos golpes e os países atingidos, aplicando draconianas sanções à moda e mando de justiceiros, piorando ainda mais as já miseráveis condições das populações desses Estados.
Organizações e políticos que, parafraseando Cyril Ramaphosa, Presidente da África do Sul, se comportam "como os antigos colonizadores".
Dirigentes e organizações africanos que alinham com a Europa, como denunciou Ousmane Sonko, primeiro-ministro senegalês, em recente conferência em Dakar, onde se manifestou contra esse tipo de comportamento ao mesmo tempo que se solidarizou com os países do Sahel atingidos por golpes de Estado.
""Não vamos abandonar os nossos irmãos do Sahel e faremos tudo para fortalecer os laços e ajudá-los no que for necessário", garantiu o primeiro-ministro do Senegal, afirmando que apesar de "não encorajar" golpes de Estado, rejeita "ser aquele que analisa os sintomas e se recusa a ver as verdadeiras causas".
O actual crescimento populacional de África, continente, com a população mais jovem do Mundo (média de 18 anos), traz consigo também uma geração mais informada com maior consciência e maturidade históricas e que vai rejeitando as amarras coloniais.
Uma nova geração que se recusa a normalizar a miséria provocada pelo neo-colonialismo e a sua sub-categoria, o endo-colonialismo, como uma fatalidade de África.
Essa geração, mais do que o futuro, afirma-se como o motor da mudança da prática do exercício do Poder político continental, defendendo a substituição de acordos de exploração e submissão de África por parcerias win win.
Neste sentido, ao recordar que a Europa não coloca sob embargo os países "que se afirmam como liberais e não respeitam as regras da União Europeia", Sonko, 49 anos, indagou, "então por que razão devem os problemas políticos em África ser resolvidos pelos africanos, mas por ordens externas que vão atacar os países irmãos e as suas populações? E concluiu, "não podemos aceitar essa situação".
A integração para salvar África de apetites coloniais passa não só por uma zona livre de comércio, mas também pela livre circulação de pessoas, intercâmbio cultural e do conhecimento/sabedoria, como elementos estruturantes e mais valias continentais.
Passa, por exemplo, por ter estudantes de diversas regiões do continente a formarem-se nas universidades de referência da Nigéria, Egipto, Senegal, Marrocos, Quénia África do Sul e outras, bem como pela troca de investigadores entre os Estados membros.
Ou pela mobilidade de trabalhadores e especialistas dentro do continente para enriquecimento das diferentes indústrias continentais e pela criação de mega projectos económicos de comunicações e transportes como a Pan-african Airlines que, numa primeira fase, junta companhias áreas da África do Sul e do Quénia.
Passa ainda por defender o património cultural e também económico de produtos referência como a capulana, kanga, kitenge, vitenge, chitenge, ankara, legose, pano do Congo, ou pano africano.
A internacionalização e a produção da capulana fora das fronteiras africanas movimentam milhões e tem permitido o enriquecimento de produtores extra-africanos, o que faz desse têxtil africano uma grande fonte de receitas para os maiores produtores.
Holanda, China, Índia, Bélgica e França são os maiores produtores da capulana, enquanto o maior e essencial consumidor, África, permanece um produtor residual, apesar das boas fábricas da Costa do Marfim, Gana, Nigéria, Tanzânia e Moçambique, entre outros.
Segundo a investigadora Myriam Jubilot de Carvalho (in prefácio de A Kapulana - Tecido de Moçambique,Verdadeira História, de Mphumo Kraveirinya), em França, a indústria têxtil, onde se inclui a produção de capulanas, gera mais riqueza financeira do que as de avião e de automóveis juntas.
De notar que a expansão da população africana, 54% do crescimento populacional mundial, trará consigo, naturalmente, um aumento exponencial de consumidores, incluindo de têxteis, onde se destaca a capulana.
Por isso, os gabinetes africanos deviam olhar para a capulana e outros símbolos de resistência de África, das suas gentes, como a rumba congolesa, património cultural africano, também como um grande activo económico, no quadro da inevitável integração.
Para tal, a UA precisa de se refundar, deixar de ser o Clube de chefes de Estados, envolver a sociedade civil e colocar no centro das suas acções os problemas dos africanos que enfrentam falta de liberdade e de dignidade.