Apesar da nova Lei ser um passo no sentido de responder às exigências dos familiares das vítimas da "intentona" do 27 de Maio, familiares exigem a abertura de processos para localização, identificação e devolução dos restos mortais e insistem na identificação dos responsáveis pelos assassinatos.
Um comunicado de imprensa distribuído pela Plataforma 27 de Maio, composta por três organizações de familiares das vítimas da repressão de 1977, diz que a nova Lei recentemente aprovado é "insuficiente", não podendo sequer ser considerado como um ponto de partida para "um verdadeiro processo de Reconciliação Nacional e Pacificação da Sociedade Angolana".
A Plataforma reafirma a exigência de que o caso 27 de Maio seja tratado separadamente dos demais conflitos políticos ocorridos enre 1975 e 2002, período histórico abrangido pela nova lei.
"É necessário um registo histórico completo para apurar as violações e abusos, identificação pormenorizada das vítimas e perpetradores, bem como pessoas com responsabilidade moral e material destes actos durante a repressão sangrenta", diz o comunicado.
A Plataforma 27 de Maio está preocupada porque a Lei do Regime Especial de Justificação de Óbitos Ocorridos em Consequência de Conflitos, não prevê exumação dos corpos, e a sua entrega às famílias, nem a identificação dos locais onde as vítimas estão enterradas.
O presidente da Fundação 27 de Maio, Silva Mateus, manifestou a sua satisfação porque passados 43 anos desde o alegado golpe, só agora é que as autoridades governamentais manifestaram interesse de legalizar os desaparecimentos.
"É preciso que a história de 27 de Maio seja bem contada, porque durante aquele período milhares de angolanos perderam suas vidas inocentemente", disse Silva Mateus.
Recentemente, o antigo primeiro-ministro e secretário-geral do MPLA, Lopo Fortunato do Nascimento, pediu que se abram os arquivos existentes no País para que os angolanos tenham acesso às informações relacionadas aos acontecimentos de 27 de Maio de 1977.
Para ele, Agostinho Neto não pode ser visto como o único responsável pelos acontecimentos.
De acordo com o político, em declarações à TV Zimbo, a abertura destes arquivos permitiria avaliar melhor o que se terá passado há 43 anos, altura em que milhares de angolanos foram perseguidos e mortos.
"Muitos encontram-se desaparecidos sem que os seus parentes saibam se estão ou não mortos, porque nunca tiveram acesso a uma certidão de óbito, nem aos restos mortais", acrescentou.
Para Lopo do Nascimento, a abertura dos arquivos permitiria averiguar profundamente o envolvimento de todos os que estiveram directamente por trás dos acontecimentos fatídicos daquele dia e nos seguintes.
Recorda-se que o Memorial Nacional em Homenagem às Vítimas dos conflitos políticos ocorridos no país, no período entre 11 de Novembro de 1975 e 4 de Abril de 2002, será construído este ano.
O monumento vai ser erguido na zona infra-estruturada da encosta da Boavista, em Luanda, e poderá ocupar dois lotes de terra com cerca de 7.500 metros quadrados.
No quadro deste processo, o Parlamento aprovou, na semana passada, a Lei do Regime Especial de Justificação de Óbitos ocorridos em Consequência de Conflitos Políticos.
O diploma vai permitir às famílias de cidadãos mortos em consequência de conflitos políticos ocorridos no país, entre 11 de Novembro de 1975 e 4 de Abril de 2002, poder solicitar certidões de óbito dos entes queridos nas conservatórias de registo civil.
Com a aprovação da Lei, o Titular do Poder Executivo deverá constituir, nos próximos dias, uma comissão para a certificação dos óbitos ocorridos em consequência de conflitos.
Neste dia, há 43 anos, ocorreu uma alegada tentativa de golpe de Estado, que estaria a ser liderada por Nito Alves que fora ministro do Interior desde 11 de Novembro de 1975 até finais de 1976 e que foi esmagada pelas forças leais ao Presidente Agostinho Neto.
Esta "intentona" terá sido forjada depois de Nito Alves, líder dos "fraccionistas", dias antes do 27 de Maio, ter sido afastado do MPLA, o que o levou, bem como a vários apoiantes seu, a invadirem a prisão de Luanda para libertar outros simpatizantes, assumindo, paralelamente o controlo da estação da rádio nacional.
O movimento de Nito Alves foi extinto de forma violenta com o apoio de tropas cubanas, tendo a ordem sido estabelecida e iniciada uma perseguição brutal aos revoltados, deixando um rasto de, dependendo das fontes, centenas ou milhares de mortos, muitos terão mesmo sido enterrados em valas comuns ou atirados ao alto mar.
A "purga" acabou por atingir muitas pessoas sem qualquer ligação a Nito Alves mas que estavam no "caminho" dos dirigentes que se mantiveram ao lado de Neto, como é defendido pela Amnistia Internacional.