Com a China, a segunda maior economia mundial e o maior importador de energia do mundo, a projectar incertezas sobre a sua capacidade de retomar o crescimento robusto que fez deste gigante asiático o motor da economia mundial nas últimas décadas, e, como isso, a fazer tremer os números das suas importações de crude, todo o sector petrolífero veste o colete à prova de balas.

E não é para menos, porque o risco de uma abrupta queda no abismo da guerra do Médio Oriente é ainda uma chama que tarda em extinguir-se, até porque, contrariando alguma distensão com a abertura das fronteiras de Gaza com o Egipto para a ajuda humanitária crescente, o ricochete ou uma bala perdida por fazer estourar o barril de pólvora, ou seja, o conflito entre Israel e o Hamas pode alastrar para a região circundante onde "nasce" 40% da produção planetária diária de crude.

Com o mundo em suspenso do desfecho de dois conflitos que incidem directa e devastadoramente no negócio do petróleo, o na Ucrânia, onde a Rússia, o segundo maior exportador do mundo e o 3º maior produtor, a travar uma guerra com o país vizinho há 19 meses, e este na Palestina (ver links em baixo nesta página), os mercados tremem mas os países mais afectados tombam mesmo se a guerra alastrar.

Face a esse risco, com dados económicos cada vez menos seguros, o Governo chines, numa iniciativa do Presidente Xi Jinping, marcou um encontro para encontrar soluções para os problemas mais salientes da economia nacional e definir os principais riscos, nomeadamente, segundo a Bloomberg, no colapso dos bancos mais pequenos e no imobiliário, além da urgente retoma do investimento estrangeiro.

Alguns analistas entendem que o compromisso pessoal de Xi Jinping neste encontro, que teve lugar no início desta semana, é garantia de que o motor da economia global nas últimas décadas não está apenas a ser reparado, pode estar mesmo em cima da mesa uma mudança mais profunda nos seus alicerces, especialmente por entenderem que algumas das áreas, como o imobiliário, que foram esses pilares, estão esgotadas para os tempos vindouros.

Alguns dados já são conhecidos, como avançou a Xinhua, a agência oficial chinesa, que sublinhou ser objectivo de Jinping criar um sistema financeiro à prova de bala, apetando a sua malha regulatória de forma a diluir potenciais riscos através de um forte investimento na modernização da sua vasta economia.

Mas, para já, estas garantias ainda não chegaram ao "coração" dos mercados, que, no caso da China de hoje, optaram, pelo menos desde a pandemia da Covid, pela opção de ver para querer, porque os riscos embutidos no maior importador de crude mundial não permitem descuidos.

E é este o húmus global que mantém o barril de Brent, nesta último dia da semana, a segunda consecutiva, bastante abaixo dos 90 USD, a fasquia-maravilha para as petroeconomias como a angolana, tendo mesmo chegado aos 84 USD, embora com uma ligeira recuperação logo a seguir, fixando-se esta sexta-feira, 03, perto das 11:00, hora de Luanda, nos 87,03 USD.

AS pedras no caminho de Angola

Em Angola, os tempos são de expectativa, não só porque a economia não mostra capacidade de sair do buraco, com cada vez mais sinais de dificuldades, seja na inflação galopante, seja na incapacidade de contornar a petrodependência, e com, sendo esse um dos mais graves problemas da actualidade, com a moeda nacional, o Kwanza à beira de uma derrocada histórica.

O problema da depreciação do Kwanza ganhou ainda mais nervuras com o Fundo Monetário Internacional (FMI) a vir a pública dizer esta semana que o Governo deve deixar a moeda flutuar livremente para que a desvalorização conduza à sua verdadeira posição, apesar de a divisa angolana ser a que demonstrou o pior desempenho em todo o mundo nos últimos tempos.

Segundo a Reuters, a queda significativa do Kwanza, cerca de 1/3 entre Maio e Junho, ainda não é suficiente, defendendo o FMI que deveria manter o ritmo de quebra sem travão, como fez o Banco Nacional através de medidas restritivas às operações cambiais.

Segundo o responsável pelo Fundo em Angola, Victor Lledo, citado pela agência, o FMI recomenda a flutuação cambial livre do Kwanza porque isso "funciona como uma almofada para choques externos", enquanto a chefe do departamento África do Fundo, Catherine Pattillo, entende que os países devem ter em conta as pressões sobre as trocas cambiais e deixar as suas moedas reajustar e depreciar.

Por detrás deste difuso e complexo mapa de soluções, está, em pano de fundo, o crude produzido e exportado por Angola, porque ainda é este o grande garante de divisas ao responder por 95% do total das exportações, mais de 30% do PIB e até 60% das receitas fiscais.

Para Angola, as contas são estas...

Para Angola, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, manter o Brent aos valores dos últimos meses, entre os 85 e os 95 USD, permite diluir os efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista e gera superavit relevante face ao valor de 75 USD por barril com que foi elaborado o OGE 2023.

O Presidente da República, João Lourenço, deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de manter a produção nacional acima de 1,1 mbpd com os campos "Ndola Sul", "Agogo Fuel ou os projectos "Begónia", "Cameia" e "Golfinho", gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.

O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.

Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.

Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.

A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.