Este arrefecimento deve-se, segundo as mais recentes projecções dos analistas dos mercados petrolíferos, à incerteza sobre o real impacto do regresso das sanções norte-americanas ao Irão, depois de o Presidente Donald Trump, de forma unilateral, ter rasgado o acordo nuclear com o Irão, assinado em 2015, pelos cinco países com assento permanente no Conselho de Segurança da ONU (EUA, Rússia, China, França e Reino Unido), mais a Alemanha e a União Europeia.
Isto, porque os restantes signatários do documento que levou à suspensão do programa nuclear do Irão, que prevê uma apertada vigilância por parte de vários organismos internacionais, com destaque para a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), já vieram garantir que vão cumprir com a sua palavra enquanto Teerão se mantiver alinhado com os requisitos do acordo.
Mas, à parte desta incerteza, surge uma realidade que pode ter contribuído para a decisão de Trump.
A par da complexa política com que os EUA gerem a estratégica malha de interesses no Médio Oriente, está o aumento contínuo da produção de petróleo nos Estados Unidos - é já o maior produtor mundial -, conseguindo isso com uma subida ou manutenção do valor do barril de crude em patamares elevados.
Se se olhar apenas para o lado económico, o que Donald Trump está a conseguir não deixa de ser pouco usual, que é o aumento da produção a correr lado a lado com o crescente valor do petróleo à custa da diminuição da produção da concorrência dos gigantes do Médio Oriente, visto que a política de cortes da OPEP, em curso desde Janeiro de 2017, onde à produção global do "cartel" fooram subtraídos 1,8 milhões de barris por dia (mbpd), levou a Arábia Saudita, por exemplo, a baixar drasticamente a sua produção.
E, com o petróleo acima dos 70 USD no mercado de Nova Iorque (WTI Texas), um sector que, circunstancialmente é estratégico para a indústria, tendo iniciado o dia nos 70,44 USD por barril, o "fracking", extracção de petróleo da rocha de xisto no subsolo através da injecção de água e químicos a altas pressões, tem o breakeven em torno deste valor, permitindo assim o regresso de milhares de pequenos produtores privados ao mercado depois de em 2014, com a queda abrupta dos preços, terem quase todos suspenso o trabalho e a maior parte pendurados em dívidas astronómicas à banca.
E são estes elementos, aumento da produção tradicional e no "fracking" dos EUA que surge o equilíbrio com a possibilidade de o Irão, afectado com as sanções de Donald Trump, deixar de introduzir, pelo menos, 1,5 milhões de barris nos mercados, sendo que o total da sua produção ronda os 3 mbpd, mas com os restantes a puderem ser assumidos pelos países consumidores que não aceitam a decisão do Presidente norte-americano, especialmente a China e a Europa, devido aos fortes interesses económicos das suas indústrias, com destaque para os contratos feitos na área da aviação, petróleos e automóvel.
Apesar de Angola estar a beneficiar fortemente com o actual momento nos mercados petrolíferos, mantendo por meses a fio um superavit superior a 20 dólares em relação à base de 50 USD por barril com que foi elaborado o Orçamento Geral do Estado para 2018, nem tudo são rosas no virar da esquina do futuro para as economias dependes das exportações de crude, coimo é o caso nacional, onde este ainda representa mais de 90 por cento das suas exportações globais.
Reservas estimadas em baixa
Informações recentes inscritas, segundo a Lusa, no prospecto da emissão de "eurobonds' de 3.000 milhões de dólares a 10 e 30 anos, Angola tem actualmente confirmadas reservas de 6 mil milhões de barris, o que permite manter a produção actual de cerca de 1,6 milhões de barris por dia apenas para os próximos 10 anos.
Ainda por cima, o Governo admite que 65% destas reservas estão localizadas em águas profundas, com custos de exploração mais caros, e, no actuam momento de volatilidade nos preços, que podem variar drasticamente em função dos equilíbrios geoestratégicos e económicos globais, podendo isso afastar os investidores tradicionais, apostando em geografias com crude mais acessível e menos custoso a extrair, como o Médio Oriente, como o Novo Jornal Online lembra aqui.
Isso pode ser uma das razões pelas quais o investimento no sector do petróleo desceu de 20,19 mil milhões de dólares em 2014, para 5,9 mil milhões de dólares em 2017.
Em 2015, a administração da Sonangol, recorda ainda a Lusa, tinha anunciado que as reservas de petróleo em Angola estavam avaliadas entre os 3.500 milhões de barris (categoria de provada) e 10.800 milhões de barris (categoria de provável).
Vantagens e desvantagens para Angola
A exploração e extracção de petróleo no Médio Oriente, onde a Arábia Saudita lidera, embora com uma ligeira oscilação nos dias que correm, o topo da lista não só local mas mundial dos países que mais crude extraem em todo o mundo, é substancialmente mais barata que em países como Angola ou a Venezuela, o que permite aos produtores árabes aguentar melhor as crises globais mas também atrair os investimentos das grandes multinacionais em épocas baixas, em detrimento das regiões onde a produção é mais cara.
Excepto se as crises forem dentro das fronteiras do próprio Médio Oriente, onde aquilo que são vantagens, como o Novo Jornal Online explicava a 17 de Março, se podem transformar em desvantagens e as desvantagens para países como Angola passam num piscar de olhos a vantagens competitivas.
Para já, Angola e a Venezuela são as duas grandes vítimas, mesmo que o objectivo não fosse esse, das políticas da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), à qual Angola aderiu em 2007, especialmente devido à sua política, determinada pela Arábia Saudita, de "extrair à vontade e em força" nos meses anteriores à crise de 2014.
Se Riade optou por esta política de "pump at will" para lidar com o agigantar da produção do petróleo de xisto, ou "fracking" norte-americano, para cuja indústria só faz sentido se o barril estiver acima dos 65/70 USD, devido ao seu elevado "breakeven", a verdade é que, no médio e longo termo, como agora se está a verificar, entre as vítimas desta estratégia está Angola... e em lugar de destaque.
No médio e longo prazo, o país vai sofrer severas consequências dos vários anos a fio de preços baixos ou moderados porque isso induziu claramente a um desinvestimento no sector e à deterioração natural dos equipamentos, exigindo agora não só tempo, que podem ser anos, mas também um forte investimento que as multinacionais podem não estar disponível a fazer porque têm como alternativa mais barata o Médio Oriente, onde é mais rápido e fácil recuperar o dinheiro.
A opinião e as contas das petrolíferas podem mudar e as suas atenções voltarem a focar-se em Angola se as coisas aquecerem mesmo no Médio Oriente e a produção dos gigantes locais, como o Irão, a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos ou o Iraque, forem severamente atingidas.