Com o barril a ser vendido a 75,64 USD, apesar de ligeiras alterações, para cima e para baixo, no decorrer do dia, Angola surge no mapa global dos exportadores de crude como um dos que mais está a beneficiar do contexto de incerteza mundial, seja o aproximar de uma possível nova crise entre o Irão e os EUA, seja devido à queda abrupta na produção da Venezuela, forjada na crise política interna que aquele país sul-americano e um dos três com maiores reservas em todo o mundo, atravessa.

A baixa da produção venezuelana, que passou de quase 3 milhões de barris por dia (mbpd) há 10 anos, para os actuais 1,5 mbpd, é, alias, a primeira da lista de razões que os analistas citados pelos sites e publicações especializadas apontam para o actual fluxo de dólares para cada barril vendido.

Isto, porque foi a crise que levou a um desinvestimento substancial e progressivo no sector produtivo que abriu caminho à queda da Venezuela do top 10 dos grandes produtores mundiais para um nível semelhante ao angolano, na ordem dos 1,5 mbpd, apesar de aquele país sul-americano ter, provavelmente, as maiores reservas mundiais de crude, que de pouco valem se não existir capacidade para o extrair.

No entanto, Angola, como a Sonangol anunciou recentemente, e provavelmente para evitar o mesmo destino da Venezuela, está a procurar inverter o quadro de desinvestimento com a recuperação do negócio de 1,2 mil milhões USD com os sul-coreanos da DSME para a compra definitiva de dois navios-sonda, que poderão ser essenciais para encontrar novas reservas e, assim, redespertar as atenções das multinacionais que nos últimos anos têm, paulatinamente, colocado as suas infra-estruturas em stand by, ou mesmo delas desistido..

A par da crise na Venezuela, os preços do barril estão igualmente a ser impulsionados com o aproximar da data-limite anunciada pelo Presidente norte-americano, 12 de Maio, para denunciar o acordo nuclear com o Irão, o mesmo que em 2015 permitiu a este produtor do Médio Oriente voltar aos mercados com os seus potenciais 4 milhões bpd mas que, face a uma reviravolta made in White House, poderão voltar a deixar o mercado aumentando a tensão do lado da procura.

Ao mesmo tempo que esta realidade mostra que os mercados acreditam que Donald Trump vai mesmo denunciar o acordo com o Irão e regressar ao programa de sanções que podem voltar a impedir o país de vender o seu petróleo nos mercados internacionais, a produção interna dos EUA não tem parado de subir, sendo já, a par da Rússia, o líder mundial.

Fica assim claro que se as permanentes crises criadas por Trump não são estratégicas, parece muito que o são, porque é a indústria petrolífera extractiva dos Estados Unidos quem mais está a beneficiar delas, conseguindo o duplo benefício de poder aumentar a produção e manter os preços em alta.

No entanto, o mundo parece unido no apelo a Trump para não dar esse passo perigoso, nomeadamente os signatários do documento que travou o programa nuclear de Teerão, que são a França, apesar dos sinais dúbios fornecidos pelo Presidente Macron, ao admitir uma renegociação, a Alemanha, a Rússia, China, Reino Unido e União Europeia, que juntam às sua preocupações com o Irão, a possibilidade de a Coreia do Norte poder voltar atrás com um acordo semelhante ao ver como os EUA dão o dito por não dito facilmente.

Recorde-se que a indústria petrolífera norte-americana conta com um subsector muito activo, ao mesmo tempo que é já um dos maiores poluidores do mundo, o petróleo de xisto, ou "fracking", que consiste na injecção de água e químicos pesados no subsolo, onshore, para extrair o petróleo e o gás natural da rocha.

Porém, devido aos enormes custos, o fracking tem um breakeven elevado, na ordem dos 70 USD/barril, razão pela qual em 2014, com a queda do valor do crude, esta indústria foi quase inteiramente à falência ou obrigada a suspender os trabalhos, voltando agora a respirar com o barril acima dos 70 dólares no mercado do Texas (WTI).

E, como cereja em cima do bolo, pelo menos no prisma dos países produtores - mas má notícia para as grandes economias consumidoras, como a China ou a Índia -, o ministro da Energia da Arábia Saudita, Khalid al-Falih, tornou público o seu receio com a falta de investimento da indústria petrolífera em alguns países porque pode conduzir em breve a uma severa escassez de oferta.

Um estudo divulgado no ano passado por uma consultora, a McKinsey, apontava mesmo para uma situação, défice de investimento no sector petrolífero global, que não era vista desde a década de 1940, ao qual Angola não escapa por causa da crise nos preços de 2014, apesar das boas notícias como o arranque do projecto Kaombo, da francesa Total, ou a vinda, ainda por confirmar, dos dois navios-sonda encomendados à sul-coreana DSME.

No entanto, essas boas notícias parecem não ser suficientes para impedir o cenário traçado pela Agência Internacional de Energia (AIE) que, no seu relatório para o ano de 2018, coloca Angola em perda significativa de produção até 2023.

A AIE perspectiva a produção angolana com menos 300 mil barris que hoje - que é de cerca de 1,6 milhões - quedando-se nos 1,29 milhões de barris diários dentro de cinco anos, essencialmente por falta de investimento na pesquisa, o mesmo fenómeno que está a reduzir a gigante Venezuela a um anão no mundo dos petróleos.