Quando se esperava que este anúncio fosse pressionar em baixa os mercados, como sempre sucede quando o "cartel" admite aumentar a produção, o barril, pelo contrário, termina a semana a subir de forma substantiva porque, ao mesmo tempo, o trafego aéreo planetário teve o maior aumento, nos últimos dias, desde que a pandemia da Covid-19 fez aterrar milhares de aviões em todo o mundo no início de 2020.

A análise mais evidente a este fenómeno, inesperado, é que a OPEP+ está confiante numa retoma económica sólida nos próximos meses, sustentando essa expectativa no, paulatino mas inexorável caminho de sucesso das campanhas massivas de vacinação contra o Sars CoV-2, havendo, para isso, sinais de que assim é nos EUA e na Europa, bem como na China, Japão, Austrália...

Ao mesmo tempo, reforçando este sentimento positivo, os dados agora revelados pela FlightRadar24, serviço global de observação do trafego aéreo, citada pela Bloomberg, mostram que desde o início de 2020, coincidindo com a "explosão" da Covid-19, não havia tantos voos comerciais como nesta semana que agora termina.

Estes dados, que se referem a voos comerciais e de carga, mostram, segundo os analistas, que o mundo se prepara para uma saída ruidosa do "longo silêncio" pandémico, com o avanço das campanhas de vacinação, gerando um vendaval de optimismo que permite - como raramente sucede - observar uma subida do valor do crude nos mercados coincidindo com o anúncio do aumento da produção pela OPEP+.

Existem ainda dados que sugerem fortemente que o trafego marítimo está igualmente em recuperação acelerada. O que é igualmente importante porque o transporte marítimo e o transporte aéreo são responsáveis por 20% do consumo mundial de petróleo.

Assim, o Brent, vendido em Londres, que é o mercado de referência para as exportações angolanas, estava, no fecho de quinta-feira, a valer 64,86 USD, mais 3.38 %, nos contratos para Maio, enquanto no WTI de Nova Iorque, por cada barril o marcado pagava 61,45 USD, mais 3.87%, igualmente para contratos de Maio.

Por detrás desta demonstração de força económica estão os EUA, a China e o Japão, enquanto, em sentido inverso, a Europa mostra estar ainda encalhada nos efeitos pandémicos, com novos confinamentos à vista em França e na Alemanha, as duas forças motrizes do continente, apesar de as campanhas de vacinação não terem parado, estando somente aquém do que era esperado.

Com este cenário como pano de fundo, a OPEP+ vai, entre Maio e Julho, injectar mais 2 milhões de barris por dia (mbpd).

Traduzido ao mês, estes 2 mbpd significam mais 350 mil bpd em Maio, mais 350 mil bpd em Junho e em Julho, o maior salto vai acontecer com mais 400 mil bpd. Ou seja, com estes dados revelados durante a reunião do "cartel" na quinta-feira, os cortes passam de cerca de 7 mbpd em finais de Abril para pouco mais de 6,5 mbpd em Maio, descendo claramente abaixo dos 6 mbpd em Julho.

Para Angola, um dos países que integram a OPEP+ enquanto membro da OPEP, este acrescento na produção pode ter pouca relevância devido ao período menos fértil na sua produção, afectada claramente por longos anos de desinvestimento, especialmente desde 2014, devido à desvalorização do barril.

Actualmente, num processo de desvitalização evidente, a produção nacional está abaixo dos 1,23 mpbd e com tendência para descer, apontando alguns organismos internacionais que até 2023 esta poderá estar a rondar "apenas" 1 mbpd, especialmente por causa do envelhecimento dos poços activos, a falta de aposta na pesquisa com, em pano de fundo, os efeitos da aposta global na transição energética para as não poluidoras pelas "majors", quase sem excepção.

Ainda assim...

A produção nacional média em 2020 foi de 1,22 mbpd, evidenciando o constante declínio devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016.

As exportações de petróleo e gás de Angola caíram 7,26% no ano passado, para 18,2 mil milhões de dólares, resultantes das vendas de 446 milhões de barris de petróleo e gás equivalente.

Estes valores condizem com a exportação de 446 milhões de barris de petróleo e gás, avaliados num preço médio de 41,8 dólares por barril, segundo números fornecidos pelo director do Gabinete de Estudo Planeamento e Estatística do Ministério dos Recursos Naturais e Petróleo, Alexandre Garrett, citado na página oficial do MIREMPET.

Isto compreende ainda a exportação média de 1,22 milhões de barris por dia, consubstanciando uma diminuição de 7,2% em relação a 2019, mostrando uma continuada perda anual da produção nacional.

Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção afasta-se cada vez mais dos patamares que se viram no passado.

Para já, com o barril na casa dos 64 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de cerca de 25 USD em cima dos 39 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.

O crude é ainda responsável por mais de 94% das exportações angolanas, mais de 50% do PIB e representa 60% das receitas do Executivo para poder gerir as necessidades da governação, o que, face a uma lenta e demorada diversificação da economia nacional, se traduz numa mais optimista entrada no novo ano e nova década do século XXI.

E no que respeita ao futuro breve, o sector exige reflexão e claramente uma forte aposta na diversificação da economia, porque, como é hoje já consensual, o petróleo não tem muito mais tempo como principal combustível da economia mundial.

O alerta da Carbon Tracker

Alias, um estudo internacional recente, elaborado pela iniciativa Carbon Tracker, citado pela Lusa, aponta Angola como um dos países mais vulneráveis ao processo global de descarbonização da economia por razões de protecção climáticas que se traduz mesmo no desinvestimento das petrolíferas no sector para investirem nas denominadas energias limpas.

Este estudo denominado "Beyond Petrostates" nota que Angola enfrenta, até 2040, um défice de receitas na casa dos 76%, o que coloca o País na linha da frente das maiores vítimas deste processo planetário de substituição do petróleo como grande fonte energética mundial, o que exige de Angola um redobrado empenho na diversificação da sua economia.

O estudo diz isso mesmo, que os países nestas condições estão obrigados a definir políticas fortes de substituição de fontes de rendimento sob risco de enfrentarem dificuldades devastadoras para o seu futuro.

Para exemplificar esse abismo que têm pela frente, o estudo revela que as quedas das receitas nos próximos anos vão ser superiores a 13 mil milhões de dólares.

A Carbon Tracker é um think tank financeiro independente que desenvolve análises detalhadas e aprofundadas sobre o impacto da transição energética nos mercados de capitais e no potencial investimento em combustíveis fósseis.