Esta agremiação de exportadores de crude que junta os 13 membros da OPEP e mais 10 "não-alinhados", com a Rússia à cabeça, que desde 2017 mantêm um acordo para definir estratégias de controlo do preço da matéria-prima, tem esta semana, hoje e sexta-feira, 04 e 05 de Março, a responsabilidade de acertar numa decisão que não deite por terra o esforço feito desde o início de 2020, quando rebentou a crise económica gerada pela pandemia da Covid-19.
Apesar de a OPEP+ existir, de forma ad hoc, desde 2017, foi em Abril de 2020 que o seu poder mais foi posto à prova na resposta que deu às quedas vertiginosas no valor do barril de petróleo, subtraindo 5,7 milhões de barris por dia (mbpd) à produção global do "cartel", conseguindo suster com relativo sucesso a deterioração da importância do crude globalmente.
Com o surgimento da vacina e o arranque quase generalizado das campanhas de imunização, ou as melhorias substanciais no controlo da pandemia, a par de sinais revigorantes nas maiores economias mundiais, como a China ou os EUA, bem como a europeia, entre os 23 membros da OPEP+ começaram a surgir indícios de vontade de aumentar a produção, especialmente por parte da Rússia.
Se, por um lado, a Rússia surge ao lado dos defensores do aumento da produção, sempre que a procura dá sinais de florescer, a Arábia Saudita é, tradicionalmente, um forte defensor da manutenção dos cortes de forma a proteger-se de sobressaltos...
E quando dois gigantes (elefantes) colidem, quem sofre são os mais frágeis (o capim), como é o caso, entre outros, de Angola, cuja infra-estrutura produtiva se tem vindo a deteriorar, os poços a perder fulgor e a produção a diminuir, apesar das medidas legislativas preventivas, seja ao nível da fiscalidade aplicada ao sector petrolífero, seja na redefinição das áreas exploráveis, como é o caso da recente alteração que permite perfurar em zonas de protecção ambiental, como parques naturais.
Ou seja, a reunião de hoje e de amanhã, quinta-feira, vai colocar, de novo os dois "elefantes" da OPEP+ em confronto, com bem presente na memória a "guerra de preços" que em Abril do ano passado gerou a mais grave perda de valor de sempre do crude, com o WTI a chegar a uns assombrosos 40 USD negativos, ou seja, mesmo a pagar 40 dólares, ninguém queria comprar por não ter já onde o armazenar.
Tudo, porque os sauditas decidiram produzir no máximo do seu potencial, que é muito, acima de 12,5 mbpd, de forma a castigar os russos por se oporem aos cortes propostos por Riade.
Agora, na reunião digital do "cartel", os analistas admitem que os dois maiores produtores e exportadores do mundo voltem a faiscar, tendo em conta que o ministro russo da Energia, Alexander Novak, já admitiu que Moscovo visa um aligeiramento das medidas de contenção à produção, enquanto os sauditas já afirmaram a sua posição, que é a de manter o rigor para evitar constrangimentos, que, normalmente, surgem quando os preços passam a ser convidativos para a produção norte-americana do fracking, cujo breakeven elevado impede aventuras em tempo de preços reduzidos do barril.
Para já, certo certo é que nas últimas duas semanas os valores do barril chegaram a níveis pré-pandémicos, acima dos 67 USD no Brent, e agora, com o aproximar desta reunião e a incerteza que a rodeia, o barril em Londres está na casa dos 64 USD, 64,52, perto das 09:40 de Luanda, a subir 0,73% face ao fecho da sessão de quarta-feira..
Esta ligeira subida notada hoje tem como pano de fundo a activação dos estímulos económicos aprovados nos EUA de 1.9 triliões USD (1,9 + 12 zeros), o efeito da vaga de frio que congelou a produção no sul dos EUA, e, apesar de tudo, a esperança de que russos e sauditas se entendam de forma a não acrescentar problemas aos muitos problemas que o sector petrolífero tem pela frente, como é o caso, entre outros, do empenho já notório das multinacionais na transição energética que, no futuro, garantidamente, fará do crude uma irrelevância, só não se sabendo quando.
No melhor cenário estimado para o epílogo deste encontro do "cartel" surge Riade a manter o corte de 1 mbpd que accionou de mote próprio, a manutenção da produção sem grandes oscilações, ou seja, os cerca de 7,2 mbpd, além do que é esperado, que é aumentar a produção em 500 mbp a partir de 01 de Abril, em sintonia com as esperadas melhorias na economia global e a consequente crescente demanda por energia onde o petróleo ainda é, apesar das ameaças, "o combustível do mundo".
O pior resultado para países como Angola seria um aumento mais substantivo da produção, que alguns analistas admitem, mesmo que no limite máximo, de 1,5 mbpd, o que levaria a um rápido declínio do valor do barril, sem que se possa antecipar até onde poderia cair nesse cenário.
No entanto, existe um novo elefante na sala desta reunião, que é um aumento significativo das tensões no Médio Oriente, com as relações Riade-Washington a esfriarem devido ao assassinato do jornalista do Washington Post, Jamal Khashoggi, saudita, por ordem, segundo a CIA, do príncipe herdeiro, Mohammed bin Salman, ou ainda a plausível redução das sanções ao Irão pela nova Administração Biden, e ainda o recrudescer do conflito no Iémen, envolvendo a guerrilha Houthi, apoiada por Teerão, e o Governo de Sanaa, apoiado por RIade.
O "cisne negro" neste complexo cenário é a possibilidade real de Joe Biden avançar para sanções sobre os membros da Casa Real saudita, incluindo o Príncipe Mohammed bin Salman, com a impossibilidade de antecipar que reacção poderá sair de Riade, não deixando de ser equacionável uma aumento do conflito na Síria, com envolvimento de Israel, actualmente com relações estreitas com osa sauditas face ao inimigo comum que é o Irão.
Angola e o futuro breve
A produção actual está abaixo dos 1,3 mbpd e em constante declínio devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016.
Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção demora a arrancar para os patamares mais próximos daqueles que se viram no passado, especialmente por causa da deterioração da infra-estrutura produtiva que desde 2014 viu os investimentos das "majors" descer, a fraca aposta na pesquisa por novas reservas e o envelhecimento de alguns dos mais importantes poços activos no offshore nacional.
Para já, com o barril em torno dos 64 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de mais de 25 USD em cima dos 39 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.
O crude é ainda responsável por mais de 94% das exportações angolanas, mais de 50% do PIB e representa 60% das receitas do Executivo para poder gerir as necessidades da governação, o que, face a uma lenta e demorada diversificação da economia nacional, se traduz numa mais optimista entrada no novo ano e nova década do século XXI.
O alerta da Carbon Tracker
Um estudo internacional recente, elaborado pela iniciativa Carbon Tracker, aponta Angola como um dos países mais vulneráveis ao processo global de descarbonização da economia por razões de protecção climáticas que se traduz mesmo no desinvestimento das petrolíferas no sector para investirem nas denominadas energias limpas.
Este estudo denominado "Beyond Petrostates" nota que Angola enfrenta, até 2040, um défice de receitas na casa dos 76%, o que coloca o País na linha da frente das maiores vítimas deste processo planetário de substituição do petróleo como grande fonte energética mundial, o que exige de Angola um redobrado empenho na diversificação da sua economia.
O estudo diz isso mesmo, que os países nestas condições estão obrigados a definir políticas fortes de substituição de fontes de rendimento sob risco de enfrentarem dificuldades devastadoras para o seu futuro.
Para exemplificar esse abismo que têm pela frente, o estudo revela que as quedas das receitas nos próximos anos vão ser superiores a 13 mil milhões de dólares.
A Carbon Tracker é um think tank financeiro independente que desenvolve análises detalhadas e aprofundadas sobre o impacto da transição energética nos mercados de capitais e no potencial investimento em combustíveis fósseis.