Nesta Cimeira, onde o assunto será quase exclusivamente a guerra na Ucrânia, visto que o outro ponto importante, a substituição do secretário-geral foi resolvido de forma antecipada prolongando o mandato de Jens Stoltenberg por mais um ano, a presença do líder ucraniano é considerada a cereja no topo do bolo e se este não estiver presente, muito do efeito mediático pretendido diluir-se-á.

Sabendo disso, e com Kiev a ter como prioridades absolutas, logo a seguir ao combate aos russos, a adesão à União Europeia e à NATO, o que faria de um dos países mais a leste da Europa, aproximar-se do coração do ocidente, Zelensky condiciona, em entrevista sua e declarações dos seus assessores a diversos media ocidentais, a ida a Vilnius com garantias de que a NATO concede e permite um processo de adesão acelerado.

Para que a Ucrânia integre a NATO, segundo os actuais estatutos deste bloco militar que está a garantir a capacidade combativa de Kiev, com um fluxo interminável de dinheiro e armas, a guerra teria de terminar antes, o que, segundo os argumentos usados pelos ucranianos, esse desfecho - o fim da guerra - só será possível em tempo razoável com a entrada da Ucrânia na NATO.

Em termos simples, se a NATO abrir a porta à Ucrânia antes do fim do conflito no leste europeu, isso significaria o início de uma guerra catastrófica do bloco ocidental militar com a Federação Russa, que, recorde-se, tanto o Presidente norte-americano, Joe Biden, como o russo, Vladimir Putin, avisaram logo após o início da invasão, que tal tornaria inevitável uma escalada clara e acelerada para um Armagedão nuclear.

Tal, para já, não está na grelha das previsões dos mais sensatos analistas militares, mas não é ma impossibilidade, até porque o Presidente ucraniano, nas suas declarações ao Walll Street Journal, foi claro: "Se não nos for dado um sinal claro de que a Cimeira de Vilnius será um momento-chave para a entrada na NATO, não fará nenhum sentido a Ucrânia estar nesse encontro".

"Quantas mais mortes de ucranianos estão dependentes de uma sentença em Vilnius?", questionou o chefe do regime ucraniano, admitindo que duvida que o bloco militar ocidental esteja preparado para dar esse sinal até 11 de Julho.

Com a Ucrânia em plena contra-ofensiva, que já vai no 26º dia, sem qualquer resultado palpável no terreno - apenas avanços mínimos em áreas sem interesse para o desfecho da guerra - e com centenas de veículos militares ocidentais, com destaque para os blindados pesados Leopard, alemães, e os Bradley, de transporte e combate de infantaria, norte-americanos, destruídos e a surgirem em centenas de vídeos espalhados pelos russos nas redes sociais, à Ucrânia resta procurar usar o campo de batalha para ganhar terreno negocial para a entrada acelerada nas duas organizações ocidentais, a NATO e a União Europeia.

Este trunfo jogado por Zelensky no jogo que se trava em torno desta guerra poderá bater de frente com a vontade pouco disfarçada de alguns dos maiores jogadores da NATO, como a Alemanha e a França, cujos lideres, Scholz e Macron, já deixaram claro que não existem condições para queimar etapas no processo de adesão de Kiev, e o próprio Presidente dos EUA, líder de facto da organização, já tinha avisado que não iria permitir facilitar a vida aos ucranianos nesse processo.

Mas a Ucrânia tem defensores acérrimos nesta outra "linha da frente" onde Kiev se bate com as armas que tem, como a Polónia ou os países bálticos, Letónia, Estónia e Lituânia, cujo papel neste processo tem sido evidente e de forte pressão para ajudar Kiev.

Outro dos trunfos de Zelensky é a história desta guerra, vincadamente marcada pela forma ruidosa como o Reino Unido, o instrumento mais fluído dos EUA no seio europeu da NATO, através do seu então primeiro-ministro, Boris Johnson, em Março de 2022, poucos dias após o início da guerra, e quando Kiev e Moscovo estavam à beira de assinar um acordo de paz depois de várias rondas negociais, impôs ao Presidente ucraniano continuar a guerra dando como contrapartida o apoio ilimitado em armamento e dinheiro e facilitação na caminhada para aderir à NATO e à União Europeia.

Agora, sempre que o apoio ocidental começa a fraquejar, os lideres ocidentais que estiveram por detrás dessa pressão sobre Kiev para manter o conflito a decorrer, Kiev atira para cima da mesa essas promessas que, segundo vários analistas, comprometem tanto a NATO como a União Europeia, como se depreende das declarações belicistas da sua presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que, desde o início, defende a derrota da Rússia no campo de batalha custe o que custar e durante o tempo que for preciso.

Face a estes compromissos, alguns assumidos publicamente, outros, por detrás dos holofotes, o melhor que Zelensky, provavelmente, poderá conseguir, é um novo sinal de aceleração da entrada na União Europeia, menos melindrosa para Moscovo, e um sinal mais ténue de garantias sobre a NATO no pós-conflito.

Porque, alias, uma das razões para que o Kremln teha mandado avançar as suas colunas sobre a Ucrânia foi, precisamente, a ameaça de entrada de Kiev na NATO, o que, para a Rússia é uma linha vermelha "sem recuo" porque tal passo seria uma "ameaça existencial" à Federação.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro de 2022 as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não era (é) a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.

O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, incluindo o sector energético, do gás natural e em parte do petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 9,5 milhões de refugiados internos e nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.