O petróleo estancou nos 98 USD depois de uma subida ininterrupta de cinco dias, quando os investidores globais começaram a perceber que a China estava a reduzir a sua actividade económica por causa, presume-se, da desaceleração da economia mundial afectada pela inflação flamejante na Europa e nos EUA e o risco igualmente quente de uma recessão que pode ser confirmada já nas próximas semanas de Washington a Bruxelas.

Como maior importador mundial de crude, a China tem um poder excepcional de influenciar a flutuação do preço do barril nos mercados, desde logo porque sendo ao mesmo tempo a segunda mais robusta economia do mundo, com o sector das exportações a servir de baluarte do seu crescimento, o consumo da matéria-prima está directamente ligado a este factor... e os mercados sabem disso melhor que ninguém.

Já depois de na sexta-feira ter chegado aos 98 USD e mostrar uma tendência de subida nitidamente alimentada ainda pelo reflexo do corte de 2 mbpd na produção pela OPEP+, na passada quarta-feira, hoje, perto das 15:00, hora de Luanda, o barril estava a valer, em Londres, onde o Brent serve de referência principal às exportações angolanas, 97,28 USD, uma quebra de 0,70%.

Por detrás deste mau momento do sector energético está o ralenti da economia global despoletado pela subida em vertigem das taxas de juro dos bancos centrais das grandes economias, uma medida tomada de urgência para diluir os efeitos devastadores da inflação que ameaçava, e ainda ameaça, o mundo de uma recessão alargada.

E no entanto...

... os cortes volumosos, 2 mbpd, pela OPEP+, que correspondem a cerca de 2 por cento da produção total global do "cartel", à volta de 50 mbpd, têm outro enquadramento geopolítico se se considerar que os Estados Unidos da América, o maior consumidor do mundo, embora igualmente o maior produtor da actualidade, com perto de 12 mbpd, à frente dos sauditas e russos, ambos oscilando entre os 7 e os 9 mbpd, fez uma gigantesca pressão diplomática para levar a organização a travar o seu ímpeto na redução da produção.

Isto, porque, tal como na Europa ocidental, Japão e no resto da economia ocidental, os EUA atravessam uma das mais graves crises económicas em décadas, com uma inflação galopante e já em recordes de mais de 40 anos, e uma recessão já irreversível ao virar da esquina, muito por causa dos efeitos colaterais da guerra, do refluxo das sanções ocidentais à Rússia, e da extraordinária valorização recente da energia, gás e petróleo, amontoando-se os protestos populares e desastres eleitorais um pouco por todo o lado.

Mas nos EUA esta questão é ainda mais relevante porque o Presidente Joe Biden e o seu Partido Democrata, enfrentam já a 08 de Novembro as temíveis eleições intercalares, onde as sondagens, muito por causa da crise económica gerada no rasto do conflito no leste europeu, apontam para a perda das maiorias que tem actualmente no Congresso, tanto na Câmara dos Representantes como no Senado, e se os Republicanos de Donald Trump dominarem estas duas câmaras, a Administração Biden fica atada de pés e mãos em algumas matérias, nomeadamente na sua acção externa, como, por exemplo, no continua e avassalador apoio financeiro e militar à Ucrânia na "sua" guerra com a Rússia, que já vai acima de 50 mil milhões USD.

Para já, Biden perdeu, como se percebe pela reacção imediata do seu Secretário de Estado, Antony Blinken, que veio dizer publicamente que o Governo de Joe Biden está permanentemente a fazer um esforço, em todas as frentes, para manter os combustíveis a preços razoáveis, embora, como se percebe pela reacção popular nos EUA, com escasso sucesso.

Isto, porque,sendo várias as razões, principalmente passa pelo facto de há muitos meses os membros da OPEP* não estarem a conseguir atingir as quotas atribuídas, o que resulta num défice face a essas metas de mais de 3,6 mbpd, mesmo tendo em conta que o corte anunciado foi bastante superior ao antecipado pelos analistas, que ira entre os 500 mil e o 1 mbpd, como o Novo Jornal noticiava na quarta-feira aqui e aqui.

Nas próximas semanas vai ser essencial perceber se o "cartel" agirá de modo a reduzir o impacto do "buraco" evidente entre a produção real e a atribuída, de forma a que os cortes que anuncia deixem de bater na carapaça de uma relativa indiferença nos mercados, conhecedores que são desta realidade.

E não menos importante será verificar qual a jogada seguinte dos EUA, que, por exemplo, tem em curso um plano arriscado de libertação de reservas estratégicas de crude, e da União Europeia, entretida que anda o bloco europeu em acrescentar mais e mais sanções à Rússia, mesmo que isso se esteja a revelar como a principal causa do pânico que varre a economia global, como, por exemplo, definir um preço máximo para a energia importada da Rússia, o que levou Moscovo a dizer que assim que tal suceder, nem ais um barril para os "países hostis".

Como azimute, o barril, se se tiver em conta as previsões dos gigantes financeiros globais, como a Godman Sachs, o barril deverá atingir os 110 USD nas próximas semanas, estando, todavia, a bola de cristal embaciada pela crise da inflação, desemprego e do medo de uma recessão nas grandes economias ocidentais ao virar da esquina do futuro.

A componente política desta reunião da OPEP+ é outra faceta a ser observada porque em Washington, segundo os media norte-americanos, Biden & Co. estão a olhar para a situação a partir de uma atitude hostil de Moscovo e Riade, dois países a atravessar as mais difíceis e complexas relações com os EUA, a ponto de o Presidente norte-americano ter visto o príncipe saudita Mohammed Bin Salman recusar-se a atender-lhe o telefone, como noticiaram os media internacionais.

Embora, como costume, não se saiba qual a posição de Angola nesta reunião, mesmo sendo um dos maiores produtores africanos, actualmente mesmo acima da Nigéria, mas por causa de grandes problemas internos em Abuja, Luanda só tem a ganhar com o resultada deste encontro de Viena de Áustria porque ainda depende grandemente dos rendimentos do petróleo para amaciar a crise económica que o país atravessa há anos.

Alias, este momento é relevante ainda porque o crude responde a 95% das exportações nacionais, mais de 35% do PIB e perto de 60% das receitas fiscais angolanas.

E, a sublimar ainda esta posição angolana, está o facto de que a sua produção actual, perto de 1,1 mbpd, está longe da quota atribuída inter pares na OPEP+, devido, essencialmente, ao envelhecimento dos seus campos e à falta de investimento na pesquisa e na manutenção da sua infra-estrutura produtiva offshore que vem em crescendo desde 2014, ano em que a crise ganhou rubor e o barril deu um tombo ruidoso para baixo da fasquia dos 100 USD.