De tal modo é assim que a tradução mais fiel dos estudos de opinião feitos ao longo dos últimos meses é que se trata de uma disputa eleitoral para castigar ou salvar o ANC e não sobre quem vai governar a África do Sul nos próximos cinco anos.
Se as sondagens estiverem certas, e costumam estar no mais desenvolvido país do continente africano, mas em vias de perder esse estatuto, o ANC ainda vai manter o poder, mas longe da maioria parlamentar e ainda mais longe das avassaladoras maiorias absolutas do passado.
O partido liderado por Cyril Ramaphosa, que disputa o segundo mandato como Presidente sul-africano, deve conseguir perto de 40% dos votos e menos de metade dos deputados eleitos, o que, se se confirmar, abrirá um novo capítulo da política nacional.
Isso, porque imporá a obrigação de negociações ao invés do quero, posso e mando como tem sido desde 1994, quando o ANC, liderado por Nelson Mandela, ganhou as primeiras eleições após o fim do regime racista do apartheid.
Mas, curiosamente, quem parece estar em condições de manter o estatuto de líder da oposição e aproximar-se ainda mais do ANC é a Aliança Democrática (AD) liderada por John Steenhuisen, vista como os "herdeiros" do voto da comunidade branca.
A AD optou por fazer alianças com alguns partidos mais pequenos para ganhar a tracção que lhe permita ultrapassar o ANC e formar Governo, apresentando como trunfo a ligação aos nacionalistas zulos do Inkatha Freedom Party e ainda ao Action SA, partido criado por um antigo autarca de Joanesburgo.
E o que os estudos de opinião parecem mostrar com cada vez mais evidência é que há uma nova geração de sul-africanos que já não estão disponíveis para dar outra oportunidade ao ANC que há 30 anos e depois de sete eleições, não parece estar à altura dos desafios.
Isso, partido da actual situação económica do país, com desemprego recorde, inflação sem paralelo, pobreza florescente, insegurança, corrupção crescente e, naquilo que parece ser a cereja no topo do bolo, cortes inexplicáveis de energia e água um pouco por todo o país.
A isto, o ANC tem respondido com explicações de conjuntura regional e internacional complexas e difíceis, prometendo ultrapassar os problemas agora com um investimento histórico na educação dos sul-africanos como chave-mestra para abrir a porta da bonança.
Se Ramaphosa vai ser capaz de estancar a hemorragia eleitoral mostrada pelas sondagens como estando prestes a suceder, o que é suportado ainda pelas eleições de 2019, onde conseguiu manter a maioria por pouco mais de 50%, ver-se-á nas próximas horas.
Mas o ANC sabe que, numa situação limite, antes de a Aliança Democrática chegar ao poder alavancada pelos nacionalistas zulos, poderá contar com a protecção, exigente, mas, ainda assim, provável, do Combatentes pela Liberdade Económica (EFF, em ingles) de Julius Malema, um radical de esquerda saído das fileiras do partido de Mandela.
E ainda do MK, a formação criada pelo antigo Presidente e líder do ANC, Jacob Zuma, que aparece agora com fortes probabilidades de eleger deputados com base no forte apoio que aparentemente tem na comunidade Zulo do Kwazulu-Natal.
Portanto, o mais certo é que o ANC mantenha o poder nos próximos cinco anos, mas este pode muito bem ser o seu canto do cisne como partido hegemónico na África do Sul.
E a razão principal para isso, como todos os analistas parecem coincidir no fundamental, é a pobreza que ganha dimensão dia após dia entre mais de metade dos 60 milhões de sul-africanos, com destaque para os trágicos números de desemprego, acima de 30%.