E é precisamente a volatilidade dos mercados gerada pelo evoluir da guerra na Ucrânia, onde um dos contendores, a Rússia, que lançou as suas colunas militares sobre o país vizinho a 24 de Fevereiro, é um dos maiores produtores/exportadores de petróleo e de gás em todo o mundo, que está a impulsionar o valor do barril.
Os mercados petrolíferos estão transformados numa montanha-russa desde que a guerra teve início, voando a 09 de Março para os 139 USD, em Londres, ameaçando mesmo bater o recorde histórico dos 147, em Julho de 2008, e caindo como uma pedra para os 95 USD a 16 de Março, a partir de onde iniciou uma lenta para aparentemente sólida recuperação.
Hoje, perto das 11:40, hora de Luanda, o Brent valorizava o barril para entrega em Abril, em mais de 2%, para os 118,42 USD, enquanto o WTI, de Nova Iorque, à mesma hora, subia 2,18%, para os 11ª,69 USD, entregas também para Abril.
Por detrás de tanta expectativa e nervosismo está a possibilidade de um crescendo nas sanções à Rússia aplicadas pelo ocidente, nomeadamente uma decisão nesse sentido, seguindo as pegadas dos Estados Unidos, que já o fez de forma integral, da União Europeia, que tem uma reunião de alto nível, o Conselho da Europa, para onde foi convidado o Presidente dos EUA, Joe Biden, e onde essa questão vai estar em cima da mesa a partir desta quinta-feira.
Sabe-se que alguns países, como a Alemanha, os Países Baixos ou a Hungria já se posicionaram claramente contra essa possibilidade, alegando questões estratégicas, porque se os EUA, que são exportadores de gás e crude, e não carecem, por isso, da energia russa, na Europa, uma decisão similar seria trágica para a economia europeia e, depois, para todo o mundo, mas que seria muito interessante para a economia norte-americana que teria, assim, um cliente rico e bom pagador para os seus excedentes de crude e gás, mas que hoje entrega diariamente a Moscovo perto de 700 milhões de euros por essas matérias-primas.
A acrescentar razões para a subida verificada hoje nos mercados está ainda uma ligeira disrupção no fornecimento oriundo do Cazaquistão, devido a razões climatéricas, e ainda a uma quebra muito acentuada dos stocks de combustíveis nos Estados Unidos, a maior economia global.
Mas os avisos já tinha sido dados pelo vice-primeiro-ministro russo, Alexander Novak, ex-ministro da Energia, que, sobre a volatilidade dos mercados, lembrou ser incontornável uma subida em vertigem do valor do barril para além dos 300 USD se o crude russo deixar de fluir para os mercados nos actuais volumes, seja porque a isso leva as sanções, seja por opção estratégica de Moscovo.
Igualmente sensível é a, aparentemente, sólida decisão da OPEP+, cartel formado em 2017 para equilibrar os mercados face ás sucessivas crises, com os 13 Países Exportadores (OPEP) e 10 desalinhados com a Rússia à frente, que controla mais de 50 por cento do crude consumido no mundo, de não mexer no calendário dos aumentos à produção definido para o pós-pandemia da Covid-19 e que, agora, face à guerra na Ucrânia, poderá ser revisto, de forma a amaciar uma possível escalada ainda mais robusta do valor nos mercados.
Mas, em claro interessa da Rússia, mas sem que isso tenha sido assumido, a OPEP+ não parece estar para maiores produções, até porque, como tem sido admitido, e disso é exemplo Angola, os membros não estão a conseguir, sequer, cumprir as metas de produção acordadas pelo grupo, muito devido à incapacidade gerada pelos cortes no investimento em pesquisa e produção nos últimos anos.
Mais. Segundo as agências especializadas, a OPEP+ ficou, em Fevereiro, mais de 1 mbpd abaixo dos objectivos do programa que passa por acrescentar mensalmente 400 mil barris por dia à produção.
Angola é um dos países que não estão a conseguir com regularidade cumprir as metas da organização devido à queda persistente da sua produção que já vem sedo observada desde 2014, devido, entre outros factores, ao desinvestimento das "majors" na pesquisa e produção devido à queda dos preços nos últimos anos, o que não foi invertido ainda com a recente alta nos mercados.
O impasse na guerra
A esta situação global soma-se o stand by aparenta nas negociações de paz no conflito na Ucrânia.
Este somatório de falta de avanços nas negociações com o anúncio, na quinta-feira da semana passada, da Agência Internacional de Energia (AIE), de que os mercados petrolíferos podem ficam sem 3 milhões de barris por dia (mbpd) provenientes da Rússia já em Abril, estão a contribuir também para inverter a tendência de baixa no valor da matéria-prima que se verificava nos últimos dias.
Esta é já a quinta semana de forte sobe e desce nos mercados do sector petrolífero, sendo o ritmo incerto marcado pela operação militar russa na Ucrânia e os seus reflexos na economia mundial, desde logo um aumento impactante nos combustíveis e nos alimentos, com risco de fome generalizada em muitos dos países menos desenvolvidos, especialmente em África e na Ásia, uma inflação galopante e a incerteza quanto ao evoluir da situação no terreno.
A isto acrescenta-se o pacote de sanções à Rússia, o mais denso jamais aplicado a um país por parte dos estados e organizações ocidentais, que, embora tenham tido o cuidado de não abranger o fornecimento da energia russa, gás e crude, está a levar a uma convulsão da economia russa e que pode, no limite, levar a que Moscovo retalie com o corte do fornecimento destas matérias-primas à Europa, que é delas fortemente dependente.
Angola é um dos países que mais está a beneficiar deste período de ganhos no sector petrolífero e o Governo de João Lourenço tem - ou tinha - uma última oportunidade para investir na diversificação da economia com o rendimento extra do petróleo e num tempo histórico em que o mundo caminha a passos largos para a transição energética, libertando-se dos combustíveis fósseis, como único caminho de se defender da catástrofe climática que se adivinha.
Este sobe e desce nos mercados é de extrema importância para Angola, País que tem uma forte dependência das exportações de crude, que representa 95% das suas exportações, mais de 35% do PIB e perto de 60% dos custos com o funcionamento diário do Estado.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro, depois de semanas de impaciente expectativa, as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional, criticando fortemente o avanço desta organização de defesa para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de KIev da soberania russa da Península da Crimeia, integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1992, com o colapso da União Soviética.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, em mais de 60%.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios...
Milhares de mortos e feridos e mais de 3 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.