No périplo que ainda decorre na região do Médio Oriente, em cada paragem que fez, entre deslocações da Turquia à Arábia Saudita, do Qatar ao Egipto, da Jordánia a Israel, onde está nesta terça-feira, 09, o chefe da diplomacia norte-americana repetiu o mesmo mantra: "o objectivo maior desta visita ao Médio Oriente é evitar o alastramento do conflito em Gaza para o resto da região".
E no momento mais determinante para o sucesso do objectivo traçado por Antony Blinken, quando estava a chegar a Telavive, o Governo israelita de Benjamin Netanyhau ordenava ou autorizava o ataque que vitimou mais uma destacada figura do Hezbollah, Wissam Al Tawil, comandante de uma importante unidade de forças especiais deste movimento apoiado pelo Irão, as Radwan.
Isto, quando se sabe, inequivocamente, que a fronteira israelo-libanesa, que separa o norte de Israel do sul do Líbano, é o local de toda a Palestina mais exposto ao risco de uma vertiginosa escalada da guerra de Gaza para o Médio Oriente, uma das mais voláteis regiões do mundo e com importância geoestratégica inigualável devido aos mais de 35% do crude consumido em todo o mundo que dali saem diariamente.
Esta evolução da situação na região é de tal modo faiscante que os mercados petrolíferos estão, finalmente, a ceder e a reagir em alta ao risco iminente de uma escalada que leve à disrupção do fornecimento da matéria-prima para o resto do mundo, como se pode verificar nos gráficos do Brent, a referência maior para as ralas exportadas por Angola, que mostram esta terça-feira uma evolução positiva de mais 1,48 %, para os 77,45 USD, perto das 11:00, hora de Luanda.
O Hezbollah, movimento com décadas de presença no sul do Líbano, e com um histórico de guerras devastadoras com Israel, a última das quais em 2006, que levou os israelitas a ceder em várias frentes, e que viram na intervenção da ONU a saída in extremis para uma derrota humilhante, tem mantido deste 07 de Outubro, data do assalto do Hamas ao sul de Israel, que desencadeou a operação em Gaza, constantes trocas de fogo de artilharia com as posições israelitas.
A fina película que separa estas trocas esporádicas de fogo entre posições do Hezbollah e das Forças de Defesa de Israel (IDF) de um conflito em larga escala é por onde os piores receios anunciados por Blinken podem surgir, mas isso não impediu os israelitas de abater nas últimas horas o comandante das Radwan do movimento pró-Irão, país que tem repetido igualmente a disponibilidade total de atacar Israel se a mortandade em Gaza não for travada.
Com esta morte de al-Tawil, mais um episódio no mínimo perigoso, depois de os israelitas terem abatido o vice do Hamas, Saleh al-Arouri, em Beirute, na semana passada, e de um ataque no túmulo do general iraniano Qassem Soleimani, que fora abatido em 2020 por um drone dos EUA em Bagdade, ter feito mais de 90 mortos, o cenário desejado por Blinken para a sua 4ª visita ao Médio Oriente em três meses, quase a aterrar em Israel, oriundo da Jordânia, é, no mínimo, um desafio.
Algumas vozes de analistas que há muito observam as tensões no Médio Oriente, encaram esta sucessão de ataques a lideres do Hamas e do Hezbollah, e o no túmulo do mítico general iraniano, antigo comandante da Guarda Revolucionária, embora a sua autoria não esteja ainda clara, é uma tentativa do Governo de Telavive é armadilhar o contexto regional para atrair os EUA para um confronto directo com o Irão.
Isto, porque as relações entre Washington e Teerão nunca foram tão tensas, porque Israel há muito que procura uma justificação para atacar o Irão e porque a eclosão de um conflito regional de grandes dimensões é a única forma de o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyhau, a braços com muitas explicações para dar sobre a incrível falha de segurança a 07 de Outubro e processos judiciais sérios, onde é arguido por crimes de corrupção e peculato, se manter livre de uma condenação judicial e política.
Condenação essa que porá, seguramente, fim à sua carreira política e o colocaria sob risco evidente de ser detido se vier a ser provada a sua ligação aos crimes de peculato e corrupção e às falhas de segurança que permitiram aos combatentes do Hamas entrar em Israel, sob a inépcia da Mossad (secreta externa), do Shin Bet (secreta interna) e da AMAN (secreta militar) consideradas entre as melhores do mundo.
Este recente ataque israelita ao carro que transportava o comandante das Radwan do Hezbollah, Wissan al-Tawil, no sul do Líbano é claramente uma pedra de grandes dimensões que entrou abruptamente na complexa e difícil diplomacia norte-americana para o Médio Oriente.
Se o objectivo maior dos EUA, como sublinhou Blinken, é impedir a explosão desta estratégica região para os interesses de Washington e que, pelo menos parece muito, Israel está empenhado em dinamitar porque os seus interesses, neste momento, não coincidem com os norte-americanos, resta agora tentar perceber o que saíra das reuniões do chefe da diplomacia dos Estados Undos com os governantes israelitas, que decorrem esta terça-feira, 09.
Nesta deslocação a Israel, Blinken voltou a insistir na extrema relevância de impedir o alastramento do conflito e, como recorda a Lusa, Antony Blinken, discutirá com as autoridades israelitas "o rumo futuro da campanha militar em Gaza", que fez mais de 23.000 mortos em três meses, bem como o que "fazer mais para proteger os civis".
"Teremos a oportunidade de partilhar com os líderes israelitas tudo o que ouvi até agora nesta viagem e também de falar com eles sobre o rumo futuro da campanha militar em Gaza", disse Blinken em declarações à imprensa na Arábia Saudita, etapa do seu périplo pelo Médio Oriente para debater a guerra no enclave palestiniano e suas repercussões.
Após visitar os Emirados Árabes Unidos (EAU) e a Arábia Saudita, o chefe da diplomacia dos Estados Unidos está em Israel, onde também insistirá com as autoridades no "imperativo absoluto de se fazer mais para proteger os civis" durante as operações militares israelitas na Faixa de Gaza, território exíguo, sobrepovoado, pobre e, agora, destruído.
"E falaremos sobre como vemos o futuro da região e de Israel, e estou convencido de que há um caminho futuro que realmente pode trazer paz e segurança duradouras a Israel, que pode garantir que o 07 de outubro nunca mais volta a acontecer e que pode unir a região", asseverou Blinken no aeroporto de Riade.
O chefe da diplomacia norte-americana também fez referência às suas conversações para evitar que a guerra alastre na região, numa altura em que crescem as preocupações sobre a abertura de novas frentes.
Evitar a escalada do conflito foi precisamente a principal motivação desta viagem de Blinken ao Médio Oriente, num contexto de intensificação das trocas de fogo fronteiriças entre o grupo xiita libanês Hezbollah e Israel, além dos ataques dos rebeldes iemenitas Huthis a navios mercantes no mar Vermelho.
"Os israelitas foram muito claros connosco quanto a quererem encontrar uma forma diplomática de avançar que crie o tipo de segurança que permita aos cidadãos israelitas regressarem aos seus lares", afirmou Blinken, sobre as trocas de fogo fronteiriças entre o Hezbollah e Israel.
E está a decorrer num momento especialmente melindroso para a Administração Biden, em ano de eleições, para as quais já decorrem acções de pré-campanha, como aquele em que, nesta segunda-feira, Joe Biden foi interrompido num discurso eleitoral por manifestantes presentes na sala exigindo um cessar-fogo imediato em Gaza, mostrando uma visível escalada da contestação popular ao apoio sem limites de Washington a Israel.
O momento foi especialmente melindroso porque Biden estava a falar da ausência de luz que o ex-Presidente e candidato às Presidenciais de Novembro próximo, Donald Trump significa para os EUA, quando uma manifestante lhe disse alto e bom sim que a ausência de luz em Gaza está a matar milhares de pessoas pela acção israelita que o Presidente dos EUA tem o poder de travar quando quiser.
Recorde-se que já morreram mais de 23 mil civis e mais de 55 mil ficarem feridos em Gaza desde que Israel iniciou a sua operação de retaliação pelos ataques de 07 de Outubro, onde o bralo-aramdo do Hamas, as Brigadas Al Qassam, deixarem um rasto de destruição e 1200 mortos, entre militares, perto de 500, e civis, israelitas e estrangeiros, além dos mais de 150 reféns levados para Gaza e cerca de 2 mil feridos.
Mais de 1,1 milhões de pessoas em Gaza, um território com apenas 365 kms2, e com 2,3 milhões de habitantes, estão deslocados de suas casas.
Este conflito já ceifou a vida a mais de 120 jornalistas, um recorde absoluto em todo o mundo para tão escasso tempo de guerra, grande parte deles alvejados deliberadamente pelas forças israelitas, e mais de 150 funcionários da ONU também perderam a vida, outro recorde sem paralelo em apenas três meses de conflito. (ver histórico nesta página, nos links em baixo)