O anúncio do reconhecimento de facto dos territórios da Ucrânia de maioria russófila e historicamente ligados à Rússia, foi precedido de uma síntese histórica que remonta ao século XVIII sobre as ligações históricas entre a Ucrânia e a Rússia, passando pela criação da União Soviética, em 1922, cinco anos depois da Revolução de Outubro de 1917, acusando mesmo Vladimir Ilyich "Lenine", o "pai" da URSS, de ter cometido um erro histórico grave ao criar a Ucrânia quando esta sempre foi, histórica e culturalmente, parte integrante da Rússia.

Vladimir Putin justificou o reconhecimento das repúblicas de Donetsk e Lugansk acusando o ocidente e a NATO de mentirem repetidamente sobre a resposta à exigência de Moscovo quanto ao seu mapa de segurança na Europa, nomeadamente quando em 1991 disse, foi prometido à Rússia que a Organização do Tratado do Atlântico Norte não avançaria para as fronteiras russas através dos antigos países do Pacto de Varsóvia, no leste europeu.

Nesta intervenção de 55 minutos, Putin lembrou que em 2000, nunca conversa com o antigo Presidente norte-americano, Bill Clinton, lhe perguntou o que pensava sobre a adesão da Rússia à NATO e este lhe disse categoricamente que isso era uma impossibilidade, tendo igualmente acusado esta organização de manter oficialmente, nos seus documentos oficiais, a Rússia como uma "ameaça séria" quando disse, é a Rússia que deve temer o avanço da NATO na Europa.

Antes de anunciar a sua decisão, que vai agora passar pela votação na Duma, o Parlamento russo, de reconhecer as duas repúblicas ainda parte do território ucraniano conhecido como Donbass, Putin disse que se acabou qualquer laço de confiança com o Ocidente, referindo-se à NATO e à União Europeia.

O que desperta a curiosidade sobre como traduzir a frase quando se sabe que estava anunciada um encontro entre o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergey Lavrov, e o Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, para quinta-feira, bem como a putativa reunião de topo Putin/Biden no final da semana, como chegou a ser anunciado pela Presidência francesa.

Face a este cenário, que vai permitir a Moscovo justificar o avanço dos tanques para as duas "novas" repúblicas sob a alegação de que servem para defender a população dos ataques do Exército ucraniano, é agora de suprema importância perceber qual a resposta da União Europeia, além das sanções, que já estavam anunciadas, nomeadamente a interrupção da inauguração do gasoduto Nord Stream 2, se este cenário se tornasse real, e dos EUA, que mantêm uma postura de suporte político e militar a Kiev.

Mas a mais importante reacção foi a do Governo de Volodymir Zelensky, o Presidente ucraniano, face a esta perde de facto de uma parcela importante do seu território, habitada por alguns milhões de habitantes e rica em combustíveis fósseis, como o carvão e o gás natural, e geograficamente de significativo realce naquela região de transição euro-asiática, ao afirmar, horas depois, que a Ucrânia não deve nada nem dará nada a Moscovo, prometendo que aqueles territórios vão fazer sempre parte do país.

Porém, quando uma boa parte do universo mediático via neste reconhecimento por parte de Moscovo o tiro de partida para a guerra, Zelensky manteve, para já, os tanques nos quartéis, parecendo, com isso, apostar claramente na diplomacia e nas sanções contra a Rússia que já estavam a ser preparadas nas capitais das grandes potências ocidentais.

Para já, em Donetsk e em Lugansk, como foi possível ver em imagens dos media pró-russos, lançamento de fogo de artifício e populares na rua a festejar a decisão do senhor do Kremlin.

No entanto, alguns analistas estavam perto das 21:00, hora de Luanda, a antecipar uma resposta bélica por parte de Kiev, que poderá desencadear uma guerra aberta, numa escalada perigosa que, no limite, pode levar a uma confrontação entre as duas maiores potências nucleares do mundo, a Rússia e os EUA.

No discurso transmitido em directo por váreias canais de televisão mundiais, Putin frisou que não pretende uma guerra acreditando que pode ser conseguido um acordo negociado sem recurso às armas. Coisa que o seu homólgo ucraniano, Zelensky, dificilmente aceitrá de bom grado.

Nesta noite de segunda para terça-feira, 22 de Fevereiro, as chancelarias das potências europeis, russa, ucraniana e norte-americana tiveram os telefones a tocar incessantemente.

Pode seguir, no fundo desta página, o fio dos acontecimentos dos últimos tempos nesta crise do leste europeu que, por exemplo, tem para Angola uma importância de grande relevo devido ao impacto que tem e vai continuar a ter na evolução do preço do petróleo, que representa 95% das exportações nacionais, 35% do PIB e perto de 60% dos gastos de funcionamento do Estado.