Esta acusação apanhou muitos dos presentes de surpresa porque são os países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO, na sigla em inglês) que estão, desde logo os EUA, que já enviaram mais de 50 mil milhões USD para Kiev, desde o início do conflito, a apoiar todo o esforço de guerra de Kiev, tanto em dinheiro como em equipamento de guerra.

Mas o que Kuleba (na foto, à esquerda, com o chefe da Nato, Jens Stoltemberg) disse, segundo analistas que se pronunciaram sobre estas declarações surpreendentes, foi que a NATO, enquanto organização, não está a intervir no conflito, tendo optado por apoiar os ucranianos através dos seus Estados-membros.

Isto, porque uma entrada directa nos combates seria um risco demasiado elevado de colocar em confronto directo os Estados Unidos e a Rússia, o que os dois Presidentes, Joe Biden e Vladimir Putin, deixaram claro que seria o início da III Guerra Mundial e um passo de gigante para um confronto nuclear catastrófico.

Apesar desta advertência de Biden e Putin, o Governo de Kiev tem insistido e pressionado a NATO para entrar na guerra sem subterfúgios, como é disso exemplo o pedido explicito para que esta organização militar se empenhe na criação de uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia.

"A NATO; a organização mais poderosa do mundo tem medo da Rússia! Não está a fazer absolutamente nada para travar Putin", disse, em tom desafiador, Kuleba, em Davos.

Ao invés, a União Europeia, mereceu fortes elogios de Kuleba, que, mais uma vez em tom provocador, eventualmente com o objectivo de forçar a NATO à acção por "vergonha", disse que Bruxelas "mostrou coragem de ir além do que se esperava" enquanto a aliança militar liderada pelos EUA, "ficou muito longe do mínimo que se exigia".

E sublinhou que a NATO prometeu tudo antes do início da guerra mas não dei nada depois do primeiro tiro, indo ainda mais longe nos ataques ao orgulho da NATO: "A guerra é sempre um teste que obriga a tirar a máscara e mostrar o que cada um vale".

Rússia promete corredor livre para cereais mas exige levantamento de sanções

O Governo russo avançou com garantias de abertura de um corredor verde para as centenas de embarcações que aguardam nos portos ucranianos do Mar Negro carregados de cereais para "alimentar" o mundo e não estão a poder fazê-lo devido ao bloqueio da armada russa, seja através de navios de guerra ao largo, seja porque tem o domínio territorial dos portos.

A questão dos cereais é já a frente de batalha mais importante desta guerra, depois daquelas onde se travam combates ferozes na área do Donbass, e no sul da Ucrânia, devido ao impacto pesado que está a ter a redução das exportações de grãos russos e ucranianos, sendo que se trata dos dois maiores produtores mundiais, e que, com o evoluir do conflito, deixaram de "alimentar" o mundo, especialmente o menos desenvolvidos, como África, o Médio Oriente ou mesmo a Ásia e a América Latina menos favorecidas.

Com o adensar do bloqueio naval russo, a Ucrânia alterou a narrativa sobre este problema, acusando Moscovo de estar a impedir a exportação dos seus cereais, mas, logo após a invasão, tanto Kiev como Moscovo anunciaram ao mundo que iriam suspender as exportações de girassol, milho, trigo e cevada, além dos seus fertilizantes, igualmente essenciais para o mundo, por razões de segurança interna.

O impacto global foi imediato, primeiro porque os preços dos cereais aumentaram para valores recorde, só a título de exemplo, o trigo aumentou 50% em escassas semanas, e, com o passar dos dias, estes cereais deixaram de chegar aos países que deles mais carecem, como é disso um bom exemplo quase todo o continente africano, onde milhões de pessoas estão na linha da frente do risco de sucumbirem à fome, especialmente na África Oriental e no Norte.

Agora, para aliviar esta iminente tragédia que envolve milhões de pessoas, como as organizações internacionais, desde logo as Nações Unidas, estão a avisar que pode atingir proporções catastróficas, a Rússia anunciou que está pronta a abrir um corredor verde humanitário para passagem de barcos com cereais pelo Mar Negro, mas exige em troca o levantamento das sanções a que o país está sujeito desde o início da invasão e que se têm vindo a agravar.

Quais as sanções que Moscovo exige ver levantadas não é anda claro, mas entre as que estão a causar maior incómodo estão a impossibilidade de importação de tecnologias estratégicas, o fecho do mundo ao seu sistema financeiro e a ameaça sólida de embargo ao seu petróleo e gás.

Os russos insistem que estão disponíveis para fazer esse esforço, pedindo igualmente aos ucranianos que contribuam desminando os portos que ainda tem sob seu controlo, desde logo o mais importante, em Odessa, a maior cidade na costa do Mar Negro, e onde está siuado o mais relevante porto marítimo comercial do país.

Morgue improvisada na Azovstal

A Azovstal, onde estiveram, até à semana passada, entrincheirados mais de 2.500 combatentes do Batalhão Azov, de cariz nazi-fascista, e que se renderam às forças russas, acaba de voltar às manchetes dos media internacionais depois de terem sido reveladas pelos russos imagens de uma morgue improvisada com centenas de cadáveres de militares ucranianos.

Estas imagens são a demonstração cabal das dificuldades por que passaram estes combatentes ao longo dos 82 dias em que estiveram sob pesados bombardeamentos e cerco russos na gigantesca unidade metalo-mecânica da cidade de Mariupol, na costa do Ma de Azov, agora parte dos territórios sob domínio completo de Moscovo.

... e a guerra continua

A Rússia está a aumentar de forma inequívoca os seus ataques a infra-estruturas de interesse militar na Ucrânia com recurso a mísseis de longo alcance e de precisão, como os Iskander ou os Kalibr, disparados de sistemas móveis terrestres, os primeiros, e de navios ou submarinos estacionados no Mar Negro.

Segundo informações veiculadas já esta quarta-feira, mais de 360 militares ucranianos podem ter morrido num ataque com quatro misseis a uma unidade militar de trânsito para a linha da frente, vários armazéns de material de guerra fornecido pela União Europeia e pelos EUA foram igualmente destruídos, provocando uma fragilização considerada importante da capacidade de resiliência das forças ucranianas.

A par destas informações, como lembrou o especialista militar ouvido pela CNN, o major-general Carlos Branco, sendo a região do Donbass a principal frente de batalha, ali as forças russas já conseguiram cercar mais de 15 mil tropas ucranianas, na área de Severodonetsk, na república independentista de Lugansk, com um previsível desfecho trágico para os defensores nacionais ucranianos.

Porém, de acordo com o Governo de Kiev, depois de vários dias a anunciar que uma vitória ucraniana estaria mais próxima que nunca, esta guerra pode agora prolongar-se por muito tempo.

A guerra entre a Ucrânia e a Rússia está a entrar numa "fase prolongada", com Moscovo à procura do controlo total da região do Donbass e da ocupação do sul, realçou esta terça-feira o ministro da Defesa ucraniano.

"A Rússia está a preparar-se para uma operação militar de longo prazo. A guerra está a entrar numa fase prolongada", salientou, citado pela Lusa, Oleksiy Reznikov, numa declaração aos ministros da Defesa da União Europeia (UE) e ao secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg.

Oleksiy Reznikov referiu que as forças russas estão actualmente a fortalecer as suas posições nos territórios que ocupam nas regiões de Zaporizhia e Kherson, para "entrarem em modo defensivo, se necessário".

"Actualmente, os principais esforços do Kremlin [presidência russa] estão focados em tentativas de cercar e destruir a consolidação das forças armadas ucranianas nas regiões de Donetsk e Lugansk", no leste do país, em parte nas mãos de separatistas pró-Rússia, analisou ainda.

O ministro da Defesa ucraniano também apontou como objectivo de Moscovo a "criação de um corredor terrestre que ligue a Rússia à Crimeia", península anexada pela Rússia em 2014, bem como a ocupação de "todo o sul da Ucrânia".

No discurso divulgado na rede social Facebook, Oleksiy Reznikov pediu aos aliados ocidentais da Ucrânia uma maior coordenação nas entregas de armas a Kiev "para libertar os territórios ucranianos o mais depressa possível".

Face a estes relatos preocupantes para, não só a capacidade de resistência ucraniana, mas essencialmente os efeitos crescentemente negativos deste conflito nas economias dos países europeus, Volodymyr Zelensky voltou a falar longamente com o Presidente francês, Emmanuel Macron, e com o chanceler Olaf Scholz, com essa preocupação em cima da mesa.

No Twitter, Zelensky explicou que estas conversas versaram sobre o que está a suceder ao nível do resgate - Moscovo diz que se tratou de uma rendição em massa - dos militares entrincheirados na metalúrgica Azovstal, em Mariupol, com mais de 260 a deixarem o local na terça-feira, dezenas gravemente feridos, permanecendo no local entre 700 e 800.

No entanto, de acordo com alguns analistas, o que o eixo franco-alemão está a procurar de forma célere é criar condições para que este conflito termine e com ele as severas consequências económicas para a economia do mundo, que começa a gerar fortes preocupações não só devido ao desemprego e à inflação no ocidente mas também uma crise galopante de insegurança alimentar com geografia cada vez mais alargada, da África à Ásia, passando ainda pela América Latina...

Para o "espectáculo" que esconde as verdadeiras preocupações dos líderes europeus, tanto Kiev como Moscovo deixaram crescer mais uma guerra de propaganda com enfoque na saída de combatentes da Azovstal, com os ucranianos a dizerem que se tratou de um resgate dos seus "heróis" enquanto os russos sublinham que se tratou de uma rendição, como o confirma o facto de todos eles terem sido conduzidos, os feridos, para hospitais russos, e os restentes para campos de prisioneiros em território controlado pelos independentistas de Donetsk pró-russos.

O reforço da capacidade de combate de Moscovo

Sem que as autoridades militares russas o tenham desmentido, para a frente de combate, o Kremlin está a enviar largas dezenas de milhares de homens das unidades militares do centro e do oriente da Rússia, de forma a reforçar o poderio militar russo no Donbass, onde decorre aquela que os dois lados já admitiram que é a batalha decisiva, ou batalhas, desta guerra e que os especialistas miliares definem como sendo a expulsão das forças ucranianas das repúblicas independentistas de Donetsk e Lugansk, e a ligação terrestre entre o Donbass e a Península da Crimeia, o que daria a Moscovo o controlo sobre todo o Mar de Azov e uma boa parte do Mar Negro.

Segundo as informações disponíveis, e dependendo das fontes, do lado russo podem estar entre 120 e 160 mil militares em avanços lentos nas frentes de combate, com reforços permanentes vindo da Rússia, procurando, tanto de sul, como de Norte, avançar e cercar as entre 80 e 100 mil tropas ucranianas, que se concentram na frente do Donbass.

O foco das forças russas é não só expulsar os ucranianos das "suas" repúblicas do Donbass (Donetsk e Lugansk) como garantir que cortam a capacidade de os aliados de Kiev conseguirem fazer chegar o material militar, desde os mísseis anti-aéreos e anti-carro, Javelin e Stinger, às viaturas blindadas enviadas pelos EUA e aliados ocidentais, para o que estão a empregar centenas de mísseis de longo, médio e curto alcance, mas com forte precisão, como os M-54 Kalibr, que estão a ser disparados dos navios estacionados no Mar Negro e da Crimeia, e os 9K-720 Iskander, de menor alcance mas mais manobráveis porque podem ser deslocados em viaturas de rodas nas imediações do campo de batalha.

Com este armamento sofisticado, os russos estão a visar vias férreas, pontes e aeródromos ou mesmo aeroportos, como sucedeu na passada semana, em Odessa, onde o aeroporto desta que é uma das maiores cidades do país, foi parcialmente destruído porque ali estava armazenada grande quantidade de equipamento militar enviado do exterior pelos países da NATO.

Já os ucranianos, sem capacidade de acção aérea, procuram, através dos meios sofisticados que estão a receber dos seus aliados, com realce para os mísseis antiaéreo e anticarro Stinger e Javelin, cuja eficácia tem forçado as colunas russas a refrear os avanços, e que podem ser o factor de equilíbrio neste conflito, não só atrasar o avanço russo para os seus objectivos como ganhar tempo de forma a desgastar as forças russas a ponto de conseguir que o Kremlin aceite negociar de forma mais vantajosa para Kiev.

Nos últimos dias, as unidades de combate ucranianas retomaram a cidade de Kahrkiv, a apenas 50 kms da Rússia, no norte da Ucrânia, chegando mesmo à fronteira do país vizinho. No entanto, esta reconquista ucraniana por não ter grande valor militar porque as forças russas, segundo alguns analistas, só permaneciam na cidade como forma de fixar forças ucranianas mantendo-as afastadas do foco principal da guerra, que é a região do Donbass.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional, criticando fortemente o avanço desta organização de defesa para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar paara a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas der fora o sector energético, gás natural e petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 4,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.