O Presidente francês Emmanuel Macron também aproveitou estas últimas horas para mostrar querer manter-se entre os que buscam a paz negociada acima de tudo e é também o momento escolhido pela Alemanha para dizer aos seus "amigos" ucranianos que as suas acções já foram melhor vistas em Berlin, o que alguns analistas encaram como sendo uma forma de pressão para forçar Kiev a apresentar alguma versatilidade negocial, enquanto a União Europeia, liderada pela alemã Ursula Leyen, mete prego a fundo nas sanções contra o Kremlin.
Este recado alemão surgiu na forma de recusa do chanceler OLaf Scholz em se deslocar a KIev depois de Kiev ter fechaod a porta a uma visita a pedido do Presidente alemão, alegando o Governo do Presidente Zelensky que Frank-Walter Steinmeier é um "amigo" de Moscovo, tendo a recusa do chefe do Exectivo de Berlin provocado uma rara ofensa diplomática do embaixador da Ucrânia na Alemanha, Andriy Melnyk, que chamou "salsicha de fígado teimosa" a Scholz.
Mas a "primeira página" da diplomacia sobre a guerra na Ucrânia desta semana está a ser desenhada pelos serviços diplomáticos do Vaticano que enviaram uma carta ao Presidente russo, Vladimir Putin, a propor uma visita do Papa Francisco a Moscovo para um encontro entre ambos, com o objectivo de, mesmo naquela longa mesa em que o senhor do Kremlin recebe as visitas, encurtar a distância entre os beligerantes para que, pelo diálogo de proximidade e não pela frieza dos mísseis disparados de longe, seja encontrado o caminho para a paz na Ucrânia.
A notícia da carta enviada pelos serviços papais foi conhecida na terça-feira mas até meio da manhã desta quarta-feira, 04, Francisco ainda não tinha recebido uma resposta de Vladimir, embora tenha havido desenvolvimentos desta arrojada iniciativa do Papa, explicada numa entrevista ao jornal italiano Corriere della Sera, onde o Sumo Pontífice e Chefe de Estado do Vaticano, admite, numa declaração que muito deve ter agradado ao seu homólogo russo, que a Rússia foi desafiada pela NATO na forma como avançou para leste na Europa sabendo que isso criaria um problema sério a Moscovo. Isto, que é uma brecha gigante na narrativa veiculada pelos media ocidentais, quer dizer que o Papa admite que a NATO teve, também, culpa no desencadear deste conflito militar no leste europeu.
Francisco disse ainda outra coisa que só pode ter caído bem a Vladimir, que foi a decisão de ir a Moscovo, se for convidado, e não a Kiev, porque entende que essa é a forma correcta de lidar com o que está em causa e porque é uma forma de, segundo alguns analistas, equilibrar o jogo político-diplomático entre russos e ucranianos que se batem em território da Ucrânia, deixando ainda a nota de que o mais próximo "aliado" na União Europeia de Moscovo, o húngaro Victor Orban, lhe confidenciou ter ouvido de Puti que a guerra estaria terminada a 09 de Maio, dia em que é comemorado na Rússia o Dia da Vitória, marcando a entrada vitoriosa do Exército Vermelho da União Soviética em Berlin em 1945, derrotando as forças nazis de Adolf Hitler, o que levou em definitivo ao fim da II Guerra Mundial.
Esta ida, provável, de Francisco a Moscovo, poderá estar a gerar alguma resistência no Kremlin porque o Papa é um crítico do seu homólogo cristão ortodoxo, Cirilo I, que tem defendido a visão de Putin sobre a guerra e ficou conhecido por uma frase, considerada deslocada por alguns especialistas religiosos, onde este defende que o conflito na Ucrânia tem uma dimensão metafísica, o que pode ser traduzido pela defesa de uma dimensão divina na génese da guerra.
E Macron voltou a falar com Putin... ao telefone
O Presidente francês, Emmanuel Macron, recém-eleito para o seu segundo mandato como Presidente da França, voltou a assinalar a sua presença na linha da frente dos que insistem numa saída diplomática para o conflito na Ucrânia, o que assume especial relevância quando os "falcões" europeus desafiam o bom senso diplomático básico com uma aposta clara e inequívoca na vitória de Kiev nesta guerra, como é o caso de Ursula Leyen, a presidente alemã da Comissão Europeia, ou o espanhol Josep Borrel, chefe da diplomacia de Bruxelas, que já disseram que querem derrotar Putin no campo de batalha, aliando-se nesse desejo como caminho único para um epílogo das hostilidades ao Presidente norte-americano, Joe Biden, e os seus Secretários de Estado, Antony Blinken, e da Defesa, Lloyd Austin.
Nesta semana onde a diplomacia voltou a brilhar no universo belicista da Europa, com o périplo do Secretário-Geral da ONU, António Guterres (ver links em baixo, nesta página), pelos países da linha da frente e pela Turquia, que mostrou ser possível salvar a face de todos sem bombas a misseis a voar, desde logo com a saída de centenas de civis da fortaleza Azovstal, em Mariupol.
Há, todavia, também perdas a registar nesta frente pacifista, como é o aparente fade out dos esforços diplomáticos do Presidente turco Recep Erdogan, com o Kremlin a mostrar algum mal-estar com o fornecimento avultado de drones letais turcos aos ucranianos, os famosos Baiktar, responsáveis pela destruição de centenas de blindados russos, e ainda de Israel, por causa da azeda troca de palavras entre o Governo de Tel Aviv e o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, a propósito da nazificação da Ucrânia apesar de o Presidente Zelensky ter "sangue judeu" alegando que também Adolf Hitler tinha "sangue judeu", o que levou os israelitas a uma resposta furiosa e a exigir formais desculpas ao Kremlin.
Voltando à retoma dos esforços franceses, aparentemente estes deram frutos imediatos, porque, da conversa entre Macron e Putin vazou a informação de que o chefe do Kremlin retomou a possibilidade de diálogo com Kiev, embora a tónica principal tenha sido a insistência para que o Chefe de Estado gaulês trave o fornecimento contínuo de armas à Ucrânia pelos países europeus e da NATO, o que pode prolongar indefinidamente esta guerra.
Disse Putin a Macron, de acordo com fontes russas, que "o Ocidente pode ajudar a pôr fim à guerra e às autoridades influenciando de Kiev nesse sentido, e acabando com o fornecimento de armas", aproveitando para, num momento em que Kiev diz ter provas de crimes de guerra cometidos pelos russos, acusar os europeus de ignorarem os crimes hediondos cometidos pelos ucranianos.
A democracia na Ucrânia
Alguns partidos da oposição na Ucrânia foram suspensos a partir de 2014, quando rebentou a crise em Kiev com o golpe de Estado que obrigou o então Presidente Viktor Yanukovych, próximo de Moscovo, a fugir para a Rússia, que diversas fontes e investigações jornalísticas colam à intervenção externa com ligações a Washington, como é o caso do Partido Comunista da Ucrânia, entre outros com ideologias próximas, mas, agora, o parlamento aprova proibição de todos os partidos políticos "pró-russos"
O parlamento ucraniano aprovou na terça-feira, como avançam as agências, a lei que regulamenta a proibição dos partidos políticos "pró-russos", medida que já está em vigor desde meados de Março, então aprovada pelo Conselho Nacional de Segurança e Defesa da Ucrânia.
Esta lei permite proibir a actividade dos partidos políticos que neguem ou justifiquem a agressão russa à Ucrânia, o que envolve, até agora, directamente, 11 partidos políticos considerados pró-russos, mas o processo pode ainda estar no começo porque o Governo de Volodymyr Zelensky está a correr tramitações para passar da suspensão de actividades à sua dissolução definitiva.
Paralelamente, estão em curso na Ucrânia detenções de dirigentes destes partidos sob acusação de traição, como é disso exemplo o líder da maior destas forças políticas e o segundo mais votado em 2019, elegendo 44 deputados, a Plataforma da Oposição - Pela Vida, Viktor Medvedchuk, detido a 12 de Abril, após ser procurado durante várias semanas.
Zelensky contra-ataca... por vídeo
Porém, nas últimas horas, e apesar das notícias de avanços substanciais dos russos no este do país, como o Ministério da Defesa ucraniano também já veio admitir, o Presidente Volodymyr Zelensky, também ele consciente das "grandes dificuldades" dos seus homens na linha da frente, veio a público garantir que não vai aceitar qualquer tipo de negociações que não garantam a manutenção da totalidade do território ucraniano sob a soberania de Kiev.
E o líder ucraniano explicou que a questão da neutralidade da Ucrânia, uma das principais exigências de Moscovo, que se traduz pela sua não adesão à NATO, só pode ser dada como garantia aos russo se isso compreender a sua saída tanto do Donbass como da Península da Crimeia, como que , como é sobejamente sabido, o Kremlin já disse que não está sequer na lista dos elementos negociáveis.
Numa entrevista a um canal de televisão árabe, a al Arabiya, Zelensky disse que, embora os russos insistam na neutralidade, para Kiev "o que mais importa é a libertação do Donbass e dos restantes territórios ocupados", incluindo a Crimeia.
Esta posição do Presidente da Ucrânia surge num momento em que a generalidade dos media ocidentais estão a dar como certo que o Presidente russo se prepara para, nos próximos dias, fazer uma declaração formal de guerra à Ucrânia, transitando daquilo a que chama de "operação militar especial" para uma guerra total, o que compreenderá a mobilização geral na Rússia e a disponibilização total dos recursos militares existentes nos arsenais do país.
Isto pode, segundo esses mesmos media, suceder a 09 de Maio, quando Putin se dirigir ao país durante as comemorações do Dia da Vitória, referente vit"ria do Exército Vermelho da então União Soviética, em 1945, sobre as forças nazis da Alemanha hitleriana.
O chefe de Estado ucraniano disse ainda nesta entrevista que, para aceitar a neutralidade exigida por Moscovo, vai insistir em obter "garantias de segurança que impeçam de forma profiláctica, ataques semelhantes no futuro".
A linha dura toma posição...
E voltou a enfatizar que todas as decisões que possa tomar no que diz respeito a eventuais negociações com Moscovo terão de passar pelo crivo de um referendo onde todos os ucranianos se deverão pronunciar para não haver dúvidas.
Mas estas afirmações de Zelensky surgem já depois de o líder do Conselho de Defesa e Segurança da Ucrânia (NSDC, sigla em inglês), Alexey Danilov, ter vindo a público dizer que "o único tratado que Kiev assinará com Moscovo vai ser o da capitulação da Rússia".
Num claro desafio a Moscovo, mas também ao seu Presidente da República, Danilov, que é um elemento da linha dura de Kiev, adiantou que Volodymyr Zelensky "não vai nem pode contornar a Constituição", que é clara ao impedir quaisquer cedências territoriais.
Face a estas declarações, alguns analistas admitem que possa haver já alguma fricção entre uma facção mais receptiva a uma ideia de acordo de paz com a Rússia, cedendo nalgumas posições, onde estará Zelensky, e outra facção, provavelmente de cariz nacionalista e radical, que não vai admitir qualquer entendimeto com o agressor que não seja a sua aceitação da derrota militar.
Os mesmos analistas admitem que o desfecho do conflito na Ucrânia pode estar mesmo a ser decidido, pelo menos em parte, já neste braço-de-ferro no seio do poder em Kiev.
O reforço da capacidade de combate de Moscovo
Sem que as autoridades militares russas o tenham desmentido, para a frente de combate, o Kremlin está a enviar largas dezenas de milhares de homens das unidades militares do centro e do oriente da Rússia, de forma a reforçar o poderio militar russo no Donbass, onde decorre aquela que os dois lados já admitiram que é a batalha decisiva desta guerra e que os especialistas miliares definem como sendo a expulsão das forças ucranianas das repúblicas independentistas de Donetsk e Lugansk, e a ligação terrestre entre o Donbass e a Península da Crimeia (ver mapa).
Segundo as informações disponíveis, e dependendo da fontes, do lado russo podem estar entre 120 e 160 mil militares em avanços lentos nas frentes de combate, com reforços permanentes vindo da Rússia, procurando, tanto de sul, como de Norte, avançar e cercar as , entre 80 e 100 mil tropas ucranianas, que se concentram na frente do Donbass.
O foco das forças russas é não só expulsar os ucranianos das "suas" repúblicas do Donbass (Donetsk e Lugansk) como garantir que cortam a capacidade de os aliados de Kiev conseguirem fazer chegar o material militar, desde os mísseis anti-aéreos e anti-carro, Javelin e Stinger, às viaturas blindadas enviadas pelos EUA e aliados ocidentais, para o que estão a empregar centenas de mísseis de longo, médio e curto alcance, mas com forte precisão, como os M-54 Kalibr, que estão a ser disparados dos navios estacionados no Mar Negro e da Crimeia, e os 9K-720 Iskander, de menor alcance mas mais manobráveis porque podem ser deslocados em viaturas de rodas nas imediações do campo de batalha.
Com este armamento sofisticado, os russos estão a visar vias férreas, pontes e aeródromos ou mesmo aeroportos, como sucedeu na passada semana, em Odessa, onde o aeroporto desta que é uma das maiores cidades do país, foi parcialmente destruído porque ali estava armazenada grande quantidade de equipamento militar enviado do exterior pelos países da NATO.
Já os ucranianos, sem capacidade de acção aérea, procuram, através dos meios sofisticados que estão a receber dos seus aliados, com realce para os mísseis antiaéreo e anticarro Stinger e Javelin, cuja eficácia tem forçado as colunas russas a refrear os avanços, e que podem ser o factor de equilíbrio neste conflito, não só atrasar o avanço russo para os seus objectivos como ganhar tempo de forma a desgastar as forças russas a ponto de conseguir que o Kremlin aceite negociar de forma mais vantajosa para Kiev.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional, criticando fortemente o avanço desta organização de defesa para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar paara a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas der fora o sector energético, gás natural e petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 4,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.